Páginas

20.7.13

Inflação Zero

Mais uma vez li nos jornais que a inflação do mês foi zero
No supermercado o pote do requeijão diminuiu de tamanho sem redução de valor
O Governo mais uma vez não entendeu, na verdade o clamor era pela redução da jornada de trabalho sem redução do salário
O macarrão era 600 passou para 500, restará ao povo comer as gramas que desapareceram do pacote
O carrinho da feira ficou mais caro e mais leve, e o Governo achou que era para baixar o IPI dos carros
Taxa SELIC, Banco Central, pagamento da Dívida Pública sem auditoria
E eu só consigo lembrar do Russo no palco:
- Inflação zero só se for na casa deles!

13.7.13

Verter

Para Anna

Quero ver-te grávida
Verter o desejo duplo
Dois "as" dois "enes" dois "bes" dois "es"
Pelo desejo exagerado de bebês

8.7.13

Previdência

Todos os meses invisto na poupança
Três ou quatro livros na estante
Para que na velhice, com tempo
Possa viver com qualidade
Mesmo que por um instante

Uma previdência literária, com tesão
E sorte na idade
Terei um par de óculos
Saramago, Lispector, Marquez entre outros
E uma boa visão monetária

3.7.13

PEC

Em plena quarta-feira de junho
Fez-se homem bomba

Implodiu 300 picaretas
Durante a votação da PEC-37

...e não precisou usar a WINCHESTER-22

13.6.13

Sobre a “greve” dos/as professores/as da rede pública estadual de Sergipe


“Los gobiernos progresistas han logrado vincular a sectores sindicales y del movimiento campesino con el Estado y han socavado o debilitado a organizaciones de clase independientes y las han sustituido por estructuras corporativas tripartitas.” James Petras


Participei de algumas assembleias de professores/as da rede pública estadual de Sergipe nos meses de maio e junho de 2013. Não sou professor da rede pública, mas participei das assembleias no intuito de a) estar solidário à causa dos/as professores/as; b) conhecer um pouco mais da dinâmica da organização sindical; c) contribuir com o debate; d) pesquisar, enquanto estudante do doutorado em educação da UFS, as ações de luta da classe trabalhadora (neste caso os/as professores/as).

                Desde a primeira reunião que participei achei estranho o posicionamento da direção do sindicato (SINTESE) com relação aos encaminhamentos postulados e os debates entre a diretoria e um grupo que passamos a chamar de “oposição” (vou chamar de “oposição” apenas para fins de exposição neste texto, já que não percebi elementos de coesão que caracterizassem uma organização política de fato).

                A leitura da realidade que faço parte do pressuposto que o “fenômeno não pode nunca ser ´como a essência´, já que ele distingue-se sempre dela e, de uma forma ou de outra, a deforma. É por isso que a percepção dos fenômenos não nos fornece nunca um conhecimento verdadeiro da essência” (CHEPTULIN, 1982). Por isso procuramos a todo o momento, durante as assembleias, estabelecer as relações e nexos históricos para compreendermos a essência da realidade observada.

                Não podemos desprezar que a organização sindical majoritária no Brasil está ligada a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e, com relação as/aos educadoras/ES, à Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), com seus quadros históricos oriundos do Partido dos Trabalhadores (PT), partido do Governo do Estado de Sergipe.

                As primeiras tensões propagadas pelo grupo de oposição durante as assembleias insinuavam o “desinteresse” do SINTESE em realizar um movimento grevista graças ao atrelamento (político) do sindicato ao Governo do Estado. A diretoria do sindicato rechaçava a todo o momento essas críticas mostrando que, historicamente, durante o Governo do PT em Sergipe, alguns greves haviam acontecido.

                Interessante notar que a Diretoria do SINTESE utilizou a estratégia de realizar inscrições de fala dos seus membros sempre após a inscrição de fala do grupo oposicionista. Dessa forma, conseguiu contrapor e reverter a euforia inicial causada pelas argumentações, sempre inflamadas, da oposição. Em todo início das assembleias aplausos para àqueles que carregam a consigna “greve já”, numa onda que parecia ser irreversível a contragosto da direção.

                A direção do sindicato utilizava de “artilharia” pesada contra os argumentos do grupo oposicionista. Recrutou parlamentares do PT (vereador e deputada) para fazer uma análise mais branda da realidade, que geralmente ultrapassa o tempo estipulado para a base se pronunciar. Assim, ficou claro que desde as assembleias iniciais a direção do sindicato pretendia “esticar a corda” ao máximo, evitando a greve de imediato, mesmo com nenhuma sinalização do Governo do Estado em negociar com a categoria ou indicar reajuste salarial (em 2011 foi realizado o último reajuste salarial).

                É indubitável que a direção do sindicato apresentava nas plenárias as perdas salariais e uma análise clara e precisa da situação da categoria ao longo dos anos. Muitos dados, informações e críticas ao Governo Estadual configuravam a fala inicial da presidenta do sindicato, como também a repetição exaustiva que o sindicato se pautava na ética e na luta histórica dos/as trabalhadores/as em educação.

                Os argumentos da diretoria para não realizar uma greve de imediato, apesar da insatisfação patente da categoria, eram os mais rasos possíveis e desqualificavam a greve como elemento primordial de luta. A diretoria do sindicato afirmava o tempo inteiro que durante a greve o movimento esvaziava-se, que muitos/as professores/as iam realizar seus afazeres pessoais, deslocados do fundamento da greve, ou mesmo realizar atividades de lazer. Afirmava que os últimos atos contaram com a participação de pouquíssimos/as professores/as e por isso não se obteve o resultado esperado nas mesas de negociação. Não podemos negar que esse esvaziamento nos movimentos paredistas é fato, porém acreditamos que não cabe à diretoria do sindicato utilizar tais argumentos para convencer a base a rejeitar a greve, correndo o risco, inclusive, de repassar o ônus do esvaziamento para a categoria sem uma leitura mais esmiuçada das causas e consequências.

                Como o Governo do Estado não apresentou proposta nenhuma, como tem sido praxe em todas as relações de poder entre “patrão” e “empregados”, foi impossível segurar o movimento grevista. Por duas semanas estive fora de Sergipe e foi nesse período que a categoria deflagrou a greve e fez com que o Governo do Estado apresentasse uma proposta para a categoria. Como em todas as mesas de negociação o Governo coloca a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) como o fiel escudeiro para justificar os percentuais pífios de reajuste salarial.

                Segundo documento do Governo apresentado na reunião de 12 de junho de 2013, a proposta de “revisão salarial” é de 7,97% para setembro “período até o qual o Governo do Estado buscará os mecanismos necessários para superar as limitações impostas pela LRF”, além disso, a formação de uma “Comissão Paritária” formada por representantes do Governo e do SINTESE (qualquer semelhança com as estratégias do Governo Federal para com o movimento grevista de 2012 dos/as professores/as federais não é mera coincidência) com o objetivo de a) fazer uma análise das folhas de pagamento da Secretaria de Educação (segundo o SINTESE há distorções entre os dados apresentados pelo Governo e a folha analisada pelo sindicato); b) “Discussão da política salarial do ano de 2012 e do retroativo de 2013”; c) “Discussão acerca da reestruturação da carreira do magistério”.

                Frente à indecência do Governo em apresentar tais propostas a assembleia começou da forma como já expliquei acima. Um clima de “Greve Já” enaltecido pelas falas da oposição, especialmente no quesito da retroatividade da “revisão salarial”, deixada para ser discutida numa mesa de negociação a partir de agosto. Numa clara demonstração do interesse em encerrar a greve (movimento natimorto, funcionando com ajuda de aparelhos e que só durou duas semanas) a diretoria utilizou das mesmas articulações para convencer a categoria que o Governo do Estado havia apresentado uma proposta, não ideal, mas suficiente para recompor a carreira, dialogar com os/as professores/as e que os eventos realizados até então estavam esvaziados e muitos estavam “furando” a greve. Chegou ao ponto de desafiar a base, afirmando que só manteria a greve se no dia seguinte à assembleia houvesse uma manifestação com dois mil professores/as na rua, em ato público.

                Neste momento lembrei-me de Quino, criador da Mafalda, que em “Normalidade II” mostra um sujeito questionando o caminhar da multidão de maneira uniforme: “E por que diabos caminhamos como carneiros sem nem saber para onde vamos?”. Assim, o convencimento estava dado, acredito que da pior forma possível. Em votação, por contraste visual, a “maioria” dos/as professores/as decidiu encerrar a greve.

                O conceito de “pior forma” se caracteriza pela estrutura montada no sentido de esvaziar a luta política dos sujeitos, de rebaixar a consciência da classe trabalhadora e de utilizar estratégias de convencimento longe da visão de totalidade e movimento do fenômeno em sua essência. As consequências disto virão no futuro, pois o encurtamento deliberado da visão crítica do sujeito repercutirá em lutas futuras e jogam na lata do lixo a possibilidade da transformação radical, abandonada por alguns setores do sindicalismo brasileiro. Estive recentemente nas assembleias realizadas na Paraíba e numa mobilização na Bahia, o par dialético singular-geral nos ajuda a compreender essa realidade que se concretiza nas entidades vinculadas à CNTE. “Se estudamos um objeto dado, do ponto de vista das categorias de singular e de geral, colocamos em evidência, por um lado, as propriedades e as ligações de caráter único, próprias somente a esse objeto e, por outro lado, as que se repetem e que são próprias a toda uma série de objetos” (CHEPTULIN, 1982).

                Acreditamos que urge a formação de quadros numa perspectiva do Materialismo Histórico Dialético para que a classe trabalhadora tenha possibilidades de fazer análises da realidade com autonomia, longe das amarras de entidades que cada vez mais se distanciam de um projeto socialista. A greve dos/as professores/as da rede pública estadual terminou, a luta por uma outra sociedade está apenas começando.

12.6.13

À espera de um milagre


O coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, escreveu um artigo em maio de 2013 sobre o Custo-Aluno Qualidade (CAQi) na Revista Educação. Cara afirma que de cada R$ 1 aplicado do FUNDEB pelos Estados e Municípios, a União injeta apenas R$ 0,10.  Diz ainda que a União fica com 57% de tudo o que se arrecada no país e estima que seriam necessários R$ 0,50, a cada R$ 1 investido em educação, por parte do Governo Federal para poder viabilizar o CAQi.

A partir desta análise diz que se essa medida tivesse sido posta em prática em 2012 a União teria investido cerca de R$ 52 bilhões no FUNDEB, ao invés de R$ 9,5 bilhões. Na verdade o Orçamento Geral da União de 2012 apontou o valor de R$ 10.571.453.350 para 2012 e para 2013 este valor aumentou para 10.745.889.355, enquanto isso a receita de 2012 esteve no patamar de R$ 2.150.458.867.507,00 e em 2013, R$ 2.276.516.541.532,00.

Por outro lado o Governo Federal, em 2012, estimou no Orçamento Geral da União R$ 655.485.955.671,00 para o pagamento do refinanciamento da dívida pública federal, em 2013 esse valor está estimado em R$ 610.065.700.590,00. Esta aparente redução da dívida pública é comemorada pelo Governo Federal, como pode ser visto no texto do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias - PLDO 2014“Em 2012, a dívida líquida do setor público manteve trajetória descendente, caindo de 36,4% do PIB em 2011 para 35,2% em 2011 (sic)” (Ministério do Planejamento). O mesmo documento aponta que a meta de superávit primário para 2014 está em R$ 167,4 bilhões para o setor público não-financeiro, ou seja, 3,1% do PIB e que deve se manter até 2016.

Quando falamos em aparente redução da dívida pública deve-se ao fato de o Governo Federal apresentar valores dos juros reais e não dos juros nominais, fazendo com que esse montante em 2013 possa chegar à cifra de R$ 900 bilhões, além disso, “Tanto a CPI como a Auditoria da Dívida Cidadã têm denunciado graves distorções na apresentação dos dados oficiais” e “De todo esse processo de escoamento não transparente dos recursos públicos por meio da dívida pública – interna e externa – resta uma grande certeza: os detentores dos títulos – em sua maioria bancos, auferem, no Brasil, os maiores lucros do mundo” (FATTORELLI, p. 49, 2012).

Para Fattorelli (idem) o estoque da dívida brasileira alcançou R$ 3.228.167.962,24, o que corresponde a 78% do PIB, divergindo dos valores apresentados pelo Governo Federal no texto do PLDO 2014. Enquanto isso os dados, de 2011, da Auditoria Cidadã da Dívida afirmam que apenas 2,99% do orçamento federal foram em investimento em educação enquanto que 45,05% foram destinados para a dívida pública.
Os dados do Governo Federal são esperançosos, os Parâmetros Macroeconômicos Projetados estimam um crescimento do PIB em 4,5% em 2014, 5% em 2015 (segundo o Governo Federal devido às obras da Copa do Mundo) e 4,5% em 2016, mantendo uma política monetária de arrocho com as projeções da SELIC em 7,28% em 2014, 7,19% em 2015 e 7,22% em 2016.

O cenário é o mesmo, não existe nenhum sinal de mudança na política do Governo Federal e até mesmo o discurso de garantia de parte do superávit primário para o PAC (R$ 67 bilhões para 2014) e desonerações tributárias, não apontam para mudanças na vida do povo brasileiro. “O crescimento sustentado com inclusão social”, apresentado nas Metas 2014-2016 não traz uma linha sequer sobre investimentos em educação, saúde, muito menos sobre o FUNDEB. As palavras-chave são consumo, crédito, dívida e superávit, por isso não podemos acreditar que o Plano Nacional de Educação (2011-2020), que se arrasta no Congresso Nacional, possa de fato transformar a realidade educacional brasileira.

REFERÊNCIA

FATTORELLI, Maria Lúcia. Caderno de Estudos – A Dívida Pública em Debate. Brasília, 2012. 80p.

2.6.13

Sem "c"er

Quero ser um homem atrás do meu tempo
Sem carro, sem carne, sem consumo
[exagerado]
Sem cocacola com ciclamato

Quero ser um homem de um único ato
Vivendo no mato
Deitado numa rede
De pés descalços
Desconectado das redes

Quero ser um homem do dedo verde
Sem calçados ou grifes
De Bangladesh

Sideral

Na terra
No mar
No ar

Conjugo, sempre
o verbo amar


15.5.13

Vela

Quando eu morrer me velem na Arapuca
Lá no topo
Cheio de velas coloridas
Rituais indígenas serão bem vindos

O Toré e a Legião devem ser marcantes
Não esqueçam que preciso de alguns minutos contemplando a paisagem
Ouvindo apenas a sinfonia marítima

As folhas do Serge indiquem o caminho
Com meus pés voltados para o mar

Digam aos burocratas que o cadáver sumiu
Desçam à praia e lá no fundo azul
Deixem-me nadar junto aos peixes

Quero ser o Brás sóbrio
Boêmio da natureza
Em seu último desejo

13.5.13

AutoExílio

Que saudade do verdelouro das tuas ruas
do chão amarelado no outono
folhas de ipês caindo mansinho

Que saudade da disputa do teu nome
rubro-negro conservador em contraste
com o verde-branco da liberdade

Que saudade do Radical discursando
da boca maldita do Ponto Cem Réis
dos jornais afixados pelo Régis
no Paraíba Palace Hotel

Que saudade da melodia da Tabajara
do fim de tarde no Sanhauá
dos mergulhos infinitos na Arapuca
da expressão máxima das praias do sul

Que saudade da casa d@ Vovo
da avenida Bahia, bem longe do Salvador
do campinho da EMLUR
do chorinho sem vela
do oceano sem tela
dos corais
azuis sem tê-la

Que saudade da escola técnica
d@s amig@s de longa data
das estrelas
do luar

Quem dera um dia poder semear
este campo
fazer florir histórias
esverdear esta bandeira
cumprimentar o sol
e dormir plenamente
ao som da seiva crescente
em paralelo com o mar

9.5.13

Desintegro-me

Répteis

E você cobra, implora
Pica
Rola
E sai voando, calada
Feito cobra alada

7.5.13

Juntos chegaremos lá...


Quem viveu o histórico 1989 deve lembrar das músicas de campanha para Presidência da República, com mais de 20 candidatos de todas as estirpes que participaram do processo de votação "direta" depois de mais de 25 anos.

Algumas músicas são inesquecíveis. "Bote fé no Velhinho, que o Velhinho é demais" da fracassada campanha de Ulisses Guimarães (vencido nas urnas até pelo então desconhecido Enéas, e só para recordar do bordão: "Meu nome é Enéas"), ou do "Lá Lá Lá Lá Brizola", ou "Lula Lá valeu a espera...".

Um dos candidatos conquistou a simpatia de parte do eleitorado com o slogan "Juntos chegaremos lá" utilizando um artifício com as mãos e o dedo indicador apontando para o "Lá" (seja ele o que for). Guilherme Afif Domingos, candidato do Partido Liberal, filiado aos grandes empresários (sempre bom lembrar que o Agronegócio também elegeu seu candidato, o nefasto Ronaldo Caiado) obteve um votação significativa.

Na época, ainda no começo da adolescência, brinquei muito com meus colegas do "Juntos chegaremos lá", sem saber o que aquilo significava. 24 anos depois acabo de descobrir. Afif assumirá uma pasta de Secretário, com status de Ministério, no Governo Dilma "da Silva". O projeto neoliberal chegou lá, junto com ele chegaram José Alencar, Henrique Meirelles, César Borges, Afif Domingos e todos aqueles que  combatemos ao longo da vida.

Lembro que quando trabalhei em Jequié/BA organizamos um ato político reivindicando mais verbas para a Universidade Pública durante a inauguração da Av. César Borges, que teimávamos chamar de Av. da Paz. Toninho Malvadeza no palanque com Paulo Souto (então governador) e o próprio César Borges (vivinho, apesar de dar nome à avenida). As faixas de protesto eram nosso único ruído naquele momento. Ao som de "abaixo as faixas" proferido do alto do palanque, Toninho Malvadeza deu o sinal para a Polícia bater e prender Augusto, então estudantes de Direito da UCSAL, que segurava uma das faixas bem ao meu lado. Augusto foi espancado e levado preso. À noite conseguimos "libertar" o preso político, acusado pela polícia de, pasmem, assalto! Depois de muita procura conseguimos um Delegado (não aliado à malvadeza) para fazer o corpo de delito em Augusto.

Essa é uma breve história entre tantas. Quantos militantes de esquerda não passaram por uma situação desta? Arriscaram sua vida pela causa?

E o resultado disso: "Juntos chegaram lá!", só não sabíamos que o projeto neoliberal teria tantos aliados.

Lauro Pires Xavier Neto
Doutorando em Educação / UFS

2.5.13

Como não utilizar o dinheiro público


No portal da transparência de Aracaju/SE verifiquei que algumas pessoas da Câmara Municipal receberam diárias de R$ 1.500,00 para participar de "Curso de Teoria e Prática de Oratória" realizado na cidade de Maceió-Al entre 25 a 28 de abril de 2013. Pela lista disponibilizada no portal da transparência nove pessoas (entre vereadores e assessores) usufruíram deste "benefício", perfazendo um total de R$ 13.500,00 apenas com as diárias (dinheiro público, sempre bom lembrar). Além disso, a Câmara Municipal pagou a inscrição do curso (mais R$ 3.600,00, ou seja R$ 400,00 por pessoa).

Pergunto: é preciso passar 4 dias em Maceió (de quinta a domingo) para fazer um curso de Oratória? Se realmente existe essa necessidade, não poderia a Câmara de Aracaju contratar um especialista na área para ministrar este curso em Aracaju, ao custo bem inferior da soma das diárias?

Um detalhe interessante é que no dia 25 de abril não houve a realização de nenhuma atividade acadêmica, apenas o "credenciamento" (conforme consta em http://www.ibradem.org.br/wp-content/uploads/2013/04/PROGAMA%C3%87%C3%83O-ABRIL.jpg), ou seja, um dia desnecessário, um gasto público desnecessário. O curso completo teve a carga horária de onze horas, sendo que efetivamente 8 horas com os palestrantes. Em resumo os vereadores de Aracaju e seus assessores foram para o Hotel Verde Mar, na praia de Pajuçara em Maceió, passar 4 dias para um curso de Oratório com carga horária efetiva de 08 horas - tudo isso arcado com dinheiro público!

Vamos ficar calados? Ou vamos denunciar mais um descaso com o cidadão?

28.4.13

O dia que durou 38 sessões


Enquanto 38 sessões do cinema de Aracaju/SE estão exibindo o auge "cultural" do momento, aliado ao "American Way of Life" (neste caso “O Homem de Ferro”), resolvi curtir meu sábado à noite, acreditem, assistindo a TV Justiça.

O programa “Grandes Julgamentos do STF” tem temáticas excelentes e para a grade do sábado foi reservado o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) da Lei do Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica. Tal ação foi impetrada em 2008 pelos Governadores do Mato Grosso do Sul, Roraima, Rio Grande do Sul, Piauí e Goiás.

Sem dúvida um programa imperdível para avaliar a ação nefasta de alguns governadores e a posição dos Ministros sobre o caso. Temerário o discurso dos promotores e advogados dos Estados que impetraram a ADIN no STF. A linha de convencimento pautada pela escassez de recursos e pela cantilena da Lei de Responsabilidade Fiscal configura-se como um discurso surrado, cansativo e com o único intuito de procrastinar a efetivação da Lei - o próprio Ministro Joaquim Barbosa, ao defender a Lei do Piso, afirma a existência desse tipo de estratégia por parte dos Governadores.

Lei essa que previa como piso (em 2008), pasmem, R$ 950,00 para os profissionais da educação formados em nível médio na modalidade Normal para uma carga horária de 40 horas semanais.

Em 2013 esse valor corrigido está em míseros R$ 1.567,00 e como a Lei não prevê os percentuais de reajuste para os profissionais com nível superior, pós-graduação e tempo de serviço, os Planos de Cargos, Carreira e Remuneração devem apontar para estes reajustes específicos o que na maioria dos municípios deste país, representa o poder soberano do Prefeito frente à uma Câmara Municipal submissa e descompromissada com os interesses do povo.

O argumento utilizado, em defesa da Lei do Piso, pelo advogado do Congresso também é preocupante. O jovem jurista afirma que os Governadores deveriam entender a Lei como algo positivo no sentido de resguardar os valores remuneratórios a partir da carga horária de 40 horas. Cita o exemplo de um professor que trabalha 20 horas e que deveria receber a metade do Piso. Ora, abaixo de um Piso salarial o que poderá existir? O subsolo? Governos e Prefeitos deveriam arcar com ônus neste caso. Se a previsão do Plano de Cargos e Carreira é de uma carga horária menor do que 40 horas o problema não é do professor é do Gestor – a lei fala em Piso e ponto!

Tenho clareza da limitação burguesa do sistema jurídico, mas a posição do Ministro Joaquim Barbosa neste caso (e em outros, como por exemplo, julgamento da cassação de Cássio Cunha Lima na Paraíba) é incontestavelmente próxima aos interesses da classe trabalhadora.

Joaquim Barbosa foi o único Ministro favorável à retroatividade do pagamento da Lei do Piso a partir de 2008. Todos os outros Ministros disseram que tal pagamento deveria ser efetivado a partir do julgamento final da causa em 2011, alegando que Estados e Municípios não teriam recursos suficientes para pagar retroativamente os profissionais da educação. "Recursos para outros fins eles tem" bradou Joaquim Barbosa.

Tenho clareza do cuidado que devemos ter quando analisamos o judiciário brasileiro. Ante a todo esse debate, baixei as mais de oito mil páginas do julgamento do chamado “Mensalão” para poder ler com calma, tirar minhas próprias conclusões (não terei condições de ler todo o documento, certamente) e fugir do discurso vazio daqueles que já foram da esquerda e não conseguem realizar uma autocrítica (“nada disso existiu” ou “não vou perder meu tempo lendo essa baboseira”), bem como estar longe do discurso que beira o fascismo, oportunista inclusive, da direita conservadora desse país.

Espero que no próximo sábado eu possa ir ao cinema assistir “O dia que durou 21 anos” ou qualquer outra produção cultural que nos ajude a ampliar nossa capacidade de pensamento crítico.

17.4.13

Ela apareceu
Como um 31 de fevereiro
Como o Cometa Halley
Em plena fim de festa
Num motel

Ela apareceu
Como o Fantasma
Da tribo Marvel
Como rodelas de anchova
Numa pizza marguerita

Ela apareceu
Como poemas de Lispector
Como uma noite fria em Mossoró
Sem piedade nem dó

Ela apareceu
Como o trema, o hífen e o circunflexo
Na nova ortografia portuguesa

Ela apareceu
Como se foge do demo
Na banda crente
Que ainda crê que Deus e ela
Existem

Universidade

Universidade

universo
adverso

Adversidade
sidade (sic)
sida
ida

{Mas a luta continua, Camaradas!}

8.4.13

Lendo Leminski

Noite de domingo
Pós firmamento
Gente enviando fichamento
Urgente
Tempo urge gente
E eu aqui lento
Lendo Leminski

Outras Remunerações Eventuais


A Lei de Acesso à Informação foi, sem dúvida, um grande avanço da participação popular no controle social. Infelizmente muitas prefeituras ainda não se adaptaram a nova legislação e insistem em manter a velha tradição política, que evita a participação da população nas questões de construção de políticas públicas e fiscalização dos recursos.

No âmbito federal, o Portal da Transparência é um bom exemplo da tentativa dos órgãos de controle para incentivar à população a participar ativamente da fiscalização dos recursos públicos. Durante anos foi questionado se havia aparato legal publicar a remuneração dos servidores públicos, se isso seria inclusive ético e seguro para os servidores. Com a Lei de Acesso à Informação, o Portal da Transparência passou a divulgar a remuneração dos servidores públicos federais, ou seja, qualquer um de nós pode acompanhar os recursos recebidos por cada servidor púbico, um avanço na participação popular no chamado controle social.

Mas, o que o cidadão comum pode fazer com esses dados além de contemplá-los? Evidentemente que o TCU e a CGU incentivam a população a encaminhar as denúncias, ou suspeitas de irregularidades, aos órgãos competentes. Acredito que minimamente, e sem precisar utilizar o recurso da denúncia, podemos também utilizar os dados para iniciar um bom debate sobre como os recursos das universidades estão sendo utilizados, mesmo estes sendo utilizados de forma legal – o que não garante que estão sendo bem utilizados.
Por exemplo, no final da gestão de um reitor de uma universidade, verificamos que alguns servidores receberam quantias vinculadas a “Outras Remunerações Eventuais”. Certamente recursos oriundos de muito suor e trabalho, especialmente daqueles sempre dedicados a gerir a coisa pública e sem problema de ordem legal. O problema é que o ex-reitor pode ter no seu currículo contas julgadas irregulares pelo TCU e um histórico de enquadramento na Lei da Ficha Limpa (além de multas a pagar). Se de repente o ex-reitor também foi beneficiado com recursos eventuais ele, como pessoa pública e com os dados constando no Portal da Transparência, deveria vir a público explicar o motivo dessa remuneração. Uma prática que deveria ser comum entre aqueles que ocupam cargos públicos.

Um ponto merece uma análise mais rebuscada. Se existem servidores que estão recebendo recursos que se acumularam durante meses, ou anos, é porque o planejamento dentro da universidade apresenta problemas. É evidente que é comum servidores receberem recursos da progressão funcional, por exemplo, acumulado durante meses (que também podemos caracterizar como uma certa inoperância da máquina administrativa), mas quando esses valores superam a marca dos R$ 30.000,00, R$ 40.000,00, R$ 60.000, não é difícil acreditar que algo não tramitou normalmente (pelo menos sob o aspecto da chamada, adorada por alguns, “burocracia”). Nestes casos, de recebimento de recursos acima da média, acreditamos que este dinheiro, se pago no tempo certo e com organização, poderia ser utilizado para outros fins (mesmo sabendo que existem rubricas específicas para pagamento de servidores, construção, compra de equipamentos etc.), como por exemplo, contratar servidores para substituir aqueles que poderiam estar fazendo pós-graduação. E são muitos servidores que estão fazendo doutorado, trabalhando, ministrando aula, viajando distâncias que superam os 300 quilômetros (verdadeiros herois).

Não custa nada a alguns servidores vir a público dialogar sobre o recebimento de “Outras Remunerações Eventuais” (no apagar das luzes de uma gestão). Boa parte dos nossos alunos é de família carente e quando são informados que um servidor recebeu, por exemplo, mais de 100 salários mínimos num único mês gera um desconforto. Num país muito bem ranqueado no quesito corrupção e com reitores com contas julgadas irregulares, nunca é demais mostrar transparência em nossas ações.
Tenho acompanhado os artigos do sociólogo e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Rodorval Ramalho, no Jornal CINFORM de Aracaju/SE.

Ao ler os textos do professor Ramalho tomo como referência outro sociólogo, Florestan Fernandes, que em 1975 escreveu (citado por Bontempi Júnior, 1995):

“(...) a universidade foi esterilizada politicamente e, diga-se de passagem, com a franca e aberta colaboração de professores e estudantes adeptos da contra-revolução e do regime ditatorial. O que ela se convertesse, nos últimos dez anos, na `universidade do silêncio´. Os elementos rebeldes ou independentes, que se identificaram com as antigas bandeiras de luta, ficaram amplamente marginalizados e em situação comparativamente pior que a dos companheiros `punidos´ e expulsos do convívio universitário. O que explica por que não surgiu uma universidade de resistência e porque só agora volta à tona a questão cultural e política da reconstrução da universidade.”

Certamente a ditadura civil-militar que matou, perseguiu e “esterilizou” amplos setores sociais, conseguiu fazer um dano tremendo à universidade. Quadros políticos, execrados pelo sistema ditatorial, foram severamente vilipendiados e expulsos gerando um vazio que durou décadas. Mas ainda podemos sentir o malogro dos generais, e seus labirintos, na universidade atual. No espaço acadêmico encontramos muitos professores conservadores, formadores de opinião que mesclam um ódio patológico a tudo que se refere à esquerda brasileira e internacional. Propositalmente confundem categorias, conceitos e especialmente, jogam a opinião púbica e seus alunos (ou pelo menos tentam), da maneira mais rasteira, contra os ideias de socialismo e comunismo. O professor Ramalho consegue fazer isso com primor. Vejamos alguns trechos do Jornal CINFORM (8 a 14 de abril de 2013): “O cerco ao deputado do Partido Social Cristão está se fechando. A caçada construiu uma unanimidade que vai de um ex-BBB e dublê de Che Guevara até o presidente da Câmara dos Deputados (...)”; “Em Cuba, na ditadura predileta dos gayzistas e dos intelectuais do miolo mole e do bolso cheio (de dinheiro público), os irmãos Castro isolavam em colônias penais todo aquele que tivesse AIDS.” E prossegue: “Jamais criticarei o direito de manifestação pública a que todos temos direito – afinal, não estamos num regime socialista”.

Se fosse apenas um desserviço à população seria fácil resolver o problema. Podemos, e devemos, solicitar um espaço no jornal para fazer um contraponto a tantos conceitos pessimamente construídos – a não ser, é claro, que esta seja a linha editorial do jornal, o que não é praxe na escolha dos colunistas. Mas, não é só isso. Ramalho é professor universitário, provavelmente do curso de sociologia da UFS e Florestan Fernandes certamente convocaria todos os segmentos organizados da comunidade universidade para dialogar com esses pontos de vista tão rasteiros, transvestidos de um olhar sobre a democracia (o título do artigo é exatamente sobre democracia: “Marco Feliciano: a democracia em xeque – II).

Por fim, Ramalho clama pelo direito que o Feliciano tem “de desenvolver seu trabalho”. Afirma ainda que “O momento da sociedade estabelecer quem é e quem não é inadequado para funções parlamentares é o eleitoral”. Como pode um sociólogo minimizar tantas questões importantes no debate sobre Estado, sociedade, relações de classe e processo eleitoral? Qual a intenção do sociólogo em destoar o debate, tirá-lo do foco central e não analisar as categorias essenciais de uma discussão nacional? Espaços como este do jornal, tão escassos, são primordiais para fortalecer a opinião pública e qualificar o debate. Infelizmente, Ramalho rebaixa a discussão e deixa transparecer seu ranço com a confusão do que ele chama de esquerda.