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28.4.13

O dia que durou 38 sessões


Enquanto 38 sessões do cinema de Aracaju/SE estão exibindo o auge "cultural" do momento, aliado ao "American Way of Life" (neste caso “O Homem de Ferro”), resolvi curtir meu sábado à noite, acreditem, assistindo a TV Justiça.

O programa “Grandes Julgamentos do STF” tem temáticas excelentes e para a grade do sábado foi reservado o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) da Lei do Piso Salarial Profissional Nacional para os Profissionais do Magistério Público da Educação Básica. Tal ação foi impetrada em 2008 pelos Governadores do Mato Grosso do Sul, Roraima, Rio Grande do Sul, Piauí e Goiás.

Sem dúvida um programa imperdível para avaliar a ação nefasta de alguns governadores e a posição dos Ministros sobre o caso. Temerário o discurso dos promotores e advogados dos Estados que impetraram a ADIN no STF. A linha de convencimento pautada pela escassez de recursos e pela cantilena da Lei de Responsabilidade Fiscal configura-se como um discurso surrado, cansativo e com o único intuito de procrastinar a efetivação da Lei - o próprio Ministro Joaquim Barbosa, ao defender a Lei do Piso, afirma a existência desse tipo de estratégia por parte dos Governadores.

Lei essa que previa como piso (em 2008), pasmem, R$ 950,00 para os profissionais da educação formados em nível médio na modalidade Normal para uma carga horária de 40 horas semanais.

Em 2013 esse valor corrigido está em míseros R$ 1.567,00 e como a Lei não prevê os percentuais de reajuste para os profissionais com nível superior, pós-graduação e tempo de serviço, os Planos de Cargos, Carreira e Remuneração devem apontar para estes reajustes específicos o que na maioria dos municípios deste país, representa o poder soberano do Prefeito frente à uma Câmara Municipal submissa e descompromissada com os interesses do povo.

O argumento utilizado, em defesa da Lei do Piso, pelo advogado do Congresso também é preocupante. O jovem jurista afirma que os Governadores deveriam entender a Lei como algo positivo no sentido de resguardar os valores remuneratórios a partir da carga horária de 40 horas. Cita o exemplo de um professor que trabalha 20 horas e que deveria receber a metade do Piso. Ora, abaixo de um Piso salarial o que poderá existir? O subsolo? Governos e Prefeitos deveriam arcar com ônus neste caso. Se a previsão do Plano de Cargos e Carreira é de uma carga horária menor do que 40 horas o problema não é do professor é do Gestor – a lei fala em Piso e ponto!

Tenho clareza da limitação burguesa do sistema jurídico, mas a posição do Ministro Joaquim Barbosa neste caso (e em outros, como por exemplo, julgamento da cassação de Cássio Cunha Lima na Paraíba) é incontestavelmente próxima aos interesses da classe trabalhadora.

Joaquim Barbosa foi o único Ministro favorável à retroatividade do pagamento da Lei do Piso a partir de 2008. Todos os outros Ministros disseram que tal pagamento deveria ser efetivado a partir do julgamento final da causa em 2011, alegando que Estados e Municípios não teriam recursos suficientes para pagar retroativamente os profissionais da educação. "Recursos para outros fins eles tem" bradou Joaquim Barbosa.

Tenho clareza do cuidado que devemos ter quando analisamos o judiciário brasileiro. Ante a todo esse debate, baixei as mais de oito mil páginas do julgamento do chamado “Mensalão” para poder ler com calma, tirar minhas próprias conclusões (não terei condições de ler todo o documento, certamente) e fugir do discurso vazio daqueles que já foram da esquerda e não conseguem realizar uma autocrítica (“nada disso existiu” ou “não vou perder meu tempo lendo essa baboseira”), bem como estar longe do discurso que beira o fascismo, oportunista inclusive, da direita conservadora desse país.

Espero que no próximo sábado eu possa ir ao cinema assistir “O dia que durou 21 anos” ou qualquer outra produção cultural que nos ajude a ampliar nossa capacidade de pensamento crítico.

17.4.13

Ela apareceu
Como um 31 de fevereiro
Como o Cometa Halley
Em plena fim de festa
Num motel

Ela apareceu
Como o Fantasma
Da tribo Marvel
Como rodelas de anchova
Numa pizza marguerita

Ela apareceu
Como poemas de Lispector
Como uma noite fria em Mossoró
Sem piedade nem dó

Ela apareceu
Como o trema, o hífen e o circunflexo
Na nova ortografia portuguesa

Ela apareceu
Como se foge do demo
Na banda crente
Que ainda crê que Deus e ela
Existem

Universidade

Universidade

universo
adverso

Adversidade
sidade (sic)
sida
ida

{Mas a luta continua, Camaradas!}

8.4.13

Lendo Leminski

Noite de domingo
Pós firmamento
Gente enviando fichamento
Urgente
Tempo urge gente
E eu aqui lento
Lendo Leminski

Outras Remunerações Eventuais


A Lei de Acesso à Informação foi, sem dúvida, um grande avanço da participação popular no controle social. Infelizmente muitas prefeituras ainda não se adaptaram a nova legislação e insistem em manter a velha tradição política, que evita a participação da população nas questões de construção de políticas públicas e fiscalização dos recursos.

No âmbito federal, o Portal da Transparência é um bom exemplo da tentativa dos órgãos de controle para incentivar à população a participar ativamente da fiscalização dos recursos públicos. Durante anos foi questionado se havia aparato legal publicar a remuneração dos servidores públicos, se isso seria inclusive ético e seguro para os servidores. Com a Lei de Acesso à Informação, o Portal da Transparência passou a divulgar a remuneração dos servidores públicos federais, ou seja, qualquer um de nós pode acompanhar os recursos recebidos por cada servidor púbico, um avanço na participação popular no chamado controle social.

Mas, o que o cidadão comum pode fazer com esses dados além de contemplá-los? Evidentemente que o TCU e a CGU incentivam a população a encaminhar as denúncias, ou suspeitas de irregularidades, aos órgãos competentes. Acredito que minimamente, e sem precisar utilizar o recurso da denúncia, podemos também utilizar os dados para iniciar um bom debate sobre como os recursos das universidades estão sendo utilizados, mesmo estes sendo utilizados de forma legal – o que não garante que estão sendo bem utilizados.
Por exemplo, no final da gestão de um reitor de uma universidade, verificamos que alguns servidores receberam quantias vinculadas a “Outras Remunerações Eventuais”. Certamente recursos oriundos de muito suor e trabalho, especialmente daqueles sempre dedicados a gerir a coisa pública e sem problema de ordem legal. O problema é que o ex-reitor pode ter no seu currículo contas julgadas irregulares pelo TCU e um histórico de enquadramento na Lei da Ficha Limpa (além de multas a pagar). Se de repente o ex-reitor também foi beneficiado com recursos eventuais ele, como pessoa pública e com os dados constando no Portal da Transparência, deveria vir a público explicar o motivo dessa remuneração. Uma prática que deveria ser comum entre aqueles que ocupam cargos públicos.

Um ponto merece uma análise mais rebuscada. Se existem servidores que estão recebendo recursos que se acumularam durante meses, ou anos, é porque o planejamento dentro da universidade apresenta problemas. É evidente que é comum servidores receberem recursos da progressão funcional, por exemplo, acumulado durante meses (que também podemos caracterizar como uma certa inoperância da máquina administrativa), mas quando esses valores superam a marca dos R$ 30.000,00, R$ 40.000,00, R$ 60.000, não é difícil acreditar que algo não tramitou normalmente (pelo menos sob o aspecto da chamada, adorada por alguns, “burocracia”). Nestes casos, de recebimento de recursos acima da média, acreditamos que este dinheiro, se pago no tempo certo e com organização, poderia ser utilizado para outros fins (mesmo sabendo que existem rubricas específicas para pagamento de servidores, construção, compra de equipamentos etc.), como por exemplo, contratar servidores para substituir aqueles que poderiam estar fazendo pós-graduação. E são muitos servidores que estão fazendo doutorado, trabalhando, ministrando aula, viajando distâncias que superam os 300 quilômetros (verdadeiros herois).

Não custa nada a alguns servidores vir a público dialogar sobre o recebimento de “Outras Remunerações Eventuais” (no apagar das luzes de uma gestão). Boa parte dos nossos alunos é de família carente e quando são informados que um servidor recebeu, por exemplo, mais de 100 salários mínimos num único mês gera um desconforto. Num país muito bem ranqueado no quesito corrupção e com reitores com contas julgadas irregulares, nunca é demais mostrar transparência em nossas ações.
Tenho acompanhado os artigos do sociólogo e professor da Universidade Federal de Sergipe (UFS), Rodorval Ramalho, no Jornal CINFORM de Aracaju/SE.

Ao ler os textos do professor Ramalho tomo como referência outro sociólogo, Florestan Fernandes, que em 1975 escreveu (citado por Bontempi Júnior, 1995):

“(...) a universidade foi esterilizada politicamente e, diga-se de passagem, com a franca e aberta colaboração de professores e estudantes adeptos da contra-revolução e do regime ditatorial. O que ela se convertesse, nos últimos dez anos, na `universidade do silêncio´. Os elementos rebeldes ou independentes, que se identificaram com as antigas bandeiras de luta, ficaram amplamente marginalizados e em situação comparativamente pior que a dos companheiros `punidos´ e expulsos do convívio universitário. O que explica por que não surgiu uma universidade de resistência e porque só agora volta à tona a questão cultural e política da reconstrução da universidade.”

Certamente a ditadura civil-militar que matou, perseguiu e “esterilizou” amplos setores sociais, conseguiu fazer um dano tremendo à universidade. Quadros políticos, execrados pelo sistema ditatorial, foram severamente vilipendiados e expulsos gerando um vazio que durou décadas. Mas ainda podemos sentir o malogro dos generais, e seus labirintos, na universidade atual. No espaço acadêmico encontramos muitos professores conservadores, formadores de opinião que mesclam um ódio patológico a tudo que se refere à esquerda brasileira e internacional. Propositalmente confundem categorias, conceitos e especialmente, jogam a opinião púbica e seus alunos (ou pelo menos tentam), da maneira mais rasteira, contra os ideias de socialismo e comunismo. O professor Ramalho consegue fazer isso com primor. Vejamos alguns trechos do Jornal CINFORM (8 a 14 de abril de 2013): “O cerco ao deputado do Partido Social Cristão está se fechando. A caçada construiu uma unanimidade que vai de um ex-BBB e dublê de Che Guevara até o presidente da Câmara dos Deputados (...)”; “Em Cuba, na ditadura predileta dos gayzistas e dos intelectuais do miolo mole e do bolso cheio (de dinheiro público), os irmãos Castro isolavam em colônias penais todo aquele que tivesse AIDS.” E prossegue: “Jamais criticarei o direito de manifestação pública a que todos temos direito – afinal, não estamos num regime socialista”.

Se fosse apenas um desserviço à população seria fácil resolver o problema. Podemos, e devemos, solicitar um espaço no jornal para fazer um contraponto a tantos conceitos pessimamente construídos – a não ser, é claro, que esta seja a linha editorial do jornal, o que não é praxe na escolha dos colunistas. Mas, não é só isso. Ramalho é professor universitário, provavelmente do curso de sociologia da UFS e Florestan Fernandes certamente convocaria todos os segmentos organizados da comunidade universidade para dialogar com esses pontos de vista tão rasteiros, transvestidos de um olhar sobre a democracia (o título do artigo é exatamente sobre democracia: “Marco Feliciano: a democracia em xeque – II).

Por fim, Ramalho clama pelo direito que o Feliciano tem “de desenvolver seu trabalho”. Afirma ainda que “O momento da sociedade estabelecer quem é e quem não é inadequado para funções parlamentares é o eleitoral”. Como pode um sociólogo minimizar tantas questões importantes no debate sobre Estado, sociedade, relações de classe e processo eleitoral? Qual a intenção do sociólogo em destoar o debate, tirá-lo do foco central e não analisar as categorias essenciais de uma discussão nacional? Espaços como este do jornal, tão escassos, são primordiais para fortalecer a opinião pública e qualificar o debate. Infelizmente, Ramalho rebaixa a discussão e deixa transparecer seu ranço com a confusão do que ele chama de esquerda.