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27.1.09

continuo escrevendo

ero, escrevo
erro, di novo
jogo f o r a
detesto

piso
amasso
desisto

leio
odeio

mesmo assim

envio
critico
releio
outru erro

não presta
insisto

continua ruim

dejeto
enjoo
deleto

sem rima
sem trama
sem gosto

insulso
insípido
inodoro
incolor

linhas tortas
forma de bolo

repasso
criticam
corrigem
comentam

mas
continuo
escrevendo

26.1.09

Não há nepotismo, não há nepotismo

Parentes de toda esfera
Colateral, bilateral, primo, cunhado, enfermo
Todos nomeados, todos nomeados
Não há nepotismo, não há nepotismo

A súmula do jogo escancarou o verbo
O cofre foi aberto, gerando mais verba
Dinheiro público pagando
Restos de campanha
Não há nepotismo, não há nepotismo

Ninguém mais é competente
Meus parentes são heróis
Não há confiança no povo
Só os meus me defendem
Com unhas e dentes
Não há nepotismo, não há nepotismo

Esposa, filho, nora, irmão
Cidade com dez mil, vinte mil
Todo mundo é parente
Mas poucos participam do banquete
Não há nepotismo, não há nepotismo

O povo do lado de cá aplaude
O povo do lado de lá reclama
Maniqueísmo eleitoral
Sem o mínimo de autocrítica
Não há nepotismo, não há nepotismo

MP não se vê
STF garantiu
TP, todos podem
Fazer a farra
E passar na TV
Não há nepotismo, não há nepotismo

Na capital, no interior
Todos dão o “bom” exemplo
Irmão meu é competente
Dinheiro público para a família
Não há nepotismo, não há nepotismo

Sobras de campanhas
Restos a pagar
Saldo em caixa
Caixa-dois-do-jeito-que-dá
Não há nepotismo, não há nepotismo

Socialista não dá exemplo
No interior quem dirá
Segue a farra meu amigo
O contribuinte pagará
Não há nepotismo, não há nepotismo

Cante lá, que eu canto cá
Já dizia o Patativa
Povo lá, parentes cá
Já diziam os governantes
Não há nepotismo, não há nepotismo

Agora não tem jeito
Povo já viu para que serve eleição
Eleger a gatunagem
A família toda empregada
E eu cá passando fome
Não há nepotismo, não há nepotismo

Não haverá nova eleição
Povo na rua
Poder de transformação
Saco cheio de arruaça
Não haverá nepotismo
Em nenhuma cidade
Desta nação!

Perguntas de um servidor que lê

Quem construiu a UFCG, a dos sete campi?
Nos livros vem o nome dos diretores,
Mas foram os diretores que transportaram as pedras?
Cajazeiras, tantas vezes construída,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
De sol-a-sol moravam seus obreiros?

No dia em que ficou pronto o Campus de Pombal para onde
Foram os seus pedreiros? O grande Campus
Está cheio de salas de aula. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Reitores? O tão cantado Cuité
Cheio de tecnologia
Para os seus estudantes? Até a controversa eleição
Na noite em que se contaram os votos
Viu candidatos gritar pelos terceirizados.

Os jovens temporários conquistaram o interior
Sozinhos?
Venceram as oposições.
Nem sequer tinha um prestador ao seu serviço?
Quando abriram as urnas
Gritaram. E ninguém mais?
Disseram que expandiu a universidade nos últimos sete anos
Quem mais a expandiu?

Em cada página uma vitória.
Quem cozinhava os festins?
Em cada campus um grande homem.
Quem pagava as despesas?

Tantas histórias
Quantas perguntas

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Perguntas de um operário que lê (Bertolt Brecht)

Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilônia, tantas vezes destruída,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
Da Lima Dourada moravam seus obreiros?

No dia em que ficou pronta a Muralha da China para onde
Foram os seus pedreiros? A grande Roma
Está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
Triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
Só tinha palácios
Para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida
Na noite em que o mar a engoliu
Viu afogados gritar por seus escravos.

O jovem Alexandre conquistou as Índias
Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
Chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?

Em cada página uma vitória.
Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?

Tantas histórias
Quantas perguntas

21.1.09

ATO EM SOLIDARIEDADE AO POVO PALESTINO EM JOÃO PESSOA-PB




Ato organizado pelo Comite Paraibano de Solidariedade ao Povo Palestino, ocorrido na Lagoa do Parque Solon de Lucena em João Pessoa-PB, 21 de janeiro de 2009.

Sanduíche de gente

Pão, gente, mortadela e comichão
Pão, salame, atum e patrão
Bauru para a periferia
Americano com ovo, salada e bomba
Para o povão

Filé de gente passado na manteiga
Fritura para todo povo
Bife dos olhos grandes
Pão de ontem com ovo
Para o povão

Salada light para a madame
Manjericão, tomate seco
Horta orgânica
E muita mostarda
Para o patrão

Osso duro
Sopa de pedra
Restos de ontem
Sobras de feira
Para o povão

Arroto de filé mignon
Nas tardes de prato vazio
Esperança de vencer o cachorro
Na corrida pela sobrevivência

Ao lado o poodle da patroa
Pão com gergelim
Pasta de atum para o gato
Vitrine para assistir
O banquete

Baguete completo
Um metro de satisfação
Meio povo, meio patrão
Acordo de última hora

Chapa quente frita a carne
Frita o povo, vira frango
Hot dog, vira-lata
Lata vira, cata lixo

Sanduíche de gente
É povo, espremido no coletivo
Apreciado pelo patrão
Digerido pela madame

Novos sabores virão
Muda tudo, novidades
Povo é gente
Não é pão
Muda tudo, novidades

Pão e pedra
Livro, mão
Muda tudo...,
Revolução

20.1.09

Não há crise, não há crise

O presidente falou que não há crise
Deu no jornal
A crise desempregou dois mil e quatrocentos
Na Paraíba, não há crise, não há crise
Mas o jornal é do governo
Não há crise, não há crise
Mas o governo é tão bom
Curou o câncer do assessor
Não há crise, não há crise
Mas o empresário é tão bom
Diminuiu o tamanho dos produtos
Para vender mais e com o mesmo preço
Não há crise, não há crise
Mas o patrão é tão bom
Diminuiu a contribuição previdenciária
E me paga por fora
Não há crise, não há crise
A Insinuante baixou os preços
Tudo em cem vezes no cartão
Não há crise, não há crise
As bolsas caíram
Mas eu não tenho bolsa nenhuma
Não há crise, não há crise
A gasolina e o cartel
Baixaram o preço
Mas eu não tenho carro
Não há crise, não há crise
Mas a passagem de ônibus aumentou
E pouca gente protestou
Não há crise, não há crise
E o Obama tomou posse
E o BBB recomeçou
Não há crise, não há crise
O presidente do Banco Central
Disse que a crise é preocupante
Mas eu não tenho conta no BC
Não há crise, não há crise
A balança acumula déficit
O superávit será raquítico
Mas balança pra mim é só na feira
Não há crise, não há crise
O outro jornal disse que a culpa é do governo
Mas ele também não é governo?
Não há crise, não há crise
Faltam cem reais para acabar o mês
E dez dias para fevereiro
Não há crise, não há crise
Não tenho cartão, nem talão de cheques
Nem me convidaram para a festa do colunista
Não há crise, não há crise
E o mínimo vai aumentar
Mas não vai dar pra comprar lagarto
Vou procurar outro bicho para jogar
Não há crise, não há crise
O imposto do carro baixou
Posso comprar em sessenta vezes
Mas só vai dar para o carro de mão
Não há crise, não há crise
Papai Noel chegou bebendo coca-cola
E o povo continua comprando
E tomando...
Não há crise, não há crise
E as bombas?
Povo mau que mata criancinha
Mas quem é mesmo o povo mau?
Não há crise, não há crise
Inflação zero, deflação
E os trocados estão cada vez
Mais miúdos
Não há crise, não há crise
Mataram o ladrão
Roubou um pão
Deixaram solto o senador
Não há crise, não há crise
Propaganda do governo
No rádio, na TV e no Outdoor
Paraíba sempre em frente
Mas afinal,
Há ou não há crise?

14.1.09

Observatório da Paraíba

Os aliados políticos da Paraíba desafiam a inteligência de todos/as. O show pirotécnico recomeçou, basta ler os dois jornais de maior circulação no estado. Um fato não podemos negar, a estratégia de dividir para alternar o poder é um sucesso, pois conseguiram sufocar a oposição no estado e o pior, cooptaram pt e pcdob que rasgaram suas vestes ideológicas e passaram a cobrar carguinhos dos agora "aliados" políticos. Lembrando um pouco da história o pcdob há muito que não representa o interesse da classe trabalhadora na Paraíba. Quando Simão Almeida trocou a aliança com o PT, na candidatura à vice na prefeitura, e aliou-se com Lúcia Braga, votei com Luiz Couto, que hoje se alia, pelo menos institucionalmente, com Maranhão.
O Observatório da Paraíba tem que começar a agir. Os aliados políticos da chapa "romper para alternar" trocam farpas para confundir a população. Vejamos: capa do Correio da Paraíba - "Caravana da reconstrução mapeia obras inacabadas na PB", capa do Jornal da Paraíba - "Relatório revela que Maranhão deixou 1.004 obras inacabadas".
Os dois jornais apontam o que todo mundo sabe, Cássio e Maranhão são responsáveis pelo caos (anunciado pelos dois tablóides) que toma conta da Paraíba. Estamos num estado arrasado por uma política mesquinha, coronelista e maniqueísta, polarizada, artificialmente, pelo mesmo grupo. Não podemos negar que sonhamos com a possibilidade de termos uma política diferenciada, que combatesse esta estrutura viciada que vivemos, porém o projeto de transformação que pretensamente iniciou-se na capital pode descambar para a mesma cantilena de que é preciso ter "aliados" políticos, de todo tipo, para ter o poder do estado.
Já é hora de analisarmos diuturnamente as ações desses grupos políticos, de construirmos nosso próprio jornal, deslocado da coligação “romper para alternar”, de termos um sítio na internet, composto por pessoas que não foram cooptadas pelo poder local e agirmos concretamente realizando eventos, seminários, simpósios, cartazes, adesivos etc., que demonstrem ativamente nosso descontentamento e nos ajude a construir uma outra Paraíba.

10.1.09

20 ANOS DA TURMA DE ELETRÔNICA - 1989/2009



Em 05 de janeiro de 1989 estive na casa do meu avô no centro da cidade de João Pessoa-PB. Como de costume ele estava cumprindo sua tarefa diária, ler o jornal. Graças a esse saudável hábito do meu avô transformei-me em um leitor voraz de jornais. Não consigo passar um dia sequer sem folhear os tablóides, principalmente os da Paraíba.

Meu avô estava sentado na sua deliciosa cadeira de balanço e me aguradava com ansiedade, pois aquele "Correio da Paraíba" trazia uma notícia especial. Lá constavam os nomes dos aprovados na seleção da Escola Técnica Federal da Paraíba, que ele ainda insistia em chamar de Escolas de Artífices. Meu nome constava entre os aprovados no curso de eletrônica e meu avô escreveu meu nome, com sua letra já cansada, na capa do jornal. Eis esta preciosidade, amarelada pelo tempo!

20 ANOS DA TURMA DE ELETRÔNICA - 1989/2009

FOTO DO 1o B DE ELETRÔNICA - ETFPB (hoje IFETPB)

30/11/1989

20 ANOS DA TURMA DE ELETRÔNICA - 1989/2009


PROGRAMAÇÃO GERAL DA SEMADEC DE 1989

19 A 25 DE SETEMBRO

9.1.09

O que esperar da educação no município de João Pessoa - PB

Já é lugar comum dizer que educação e saúde devem ser os pilares de uma gestão municipal, que todo prefeito deve se preocupar em melhorar as escolas, a formação de professores, os postos de saúde etc. Torna-se um clichê, em todas as peças publicitárias de propaganda política, o candidato a prefeito afirmar que irá investir maciçamente nestas áreas. Porém é preciso agir, transformar discursos em ações concretas e melhorar efetivamente os serviços ofertados pelo poder público, mas como fazê-lo?
O sucateamento da escola pública é uma ação deliberada, histórica e que sempre privilegiou os grupos políticos dominantes. Sabemos da dificuldade em reverter tantos anos de descaso, tanto anos sem concurso público, sem reformar as escolas – processos que desencadearam uma cultura do desânimo e da chamada normose (perceber os fenômenos anormais como normais).
Alguns analistas afirmam que o problema não é uma questão salarial dos professores e técnicos administrativos, basta um bom projeto pedagógico e ações didáticas para a escola pública transformar-se. Evidentemente que estes analistas corroboram com a idéia de cortar “custeio” do orçamento público e de investir em infra-estrutura, seguindo a lógica neoliberal do Estado Mínimo. Esta lógica nefasta afunda cada vez mais a categoria de professor, distorcendo o debate e ampliando o fosso entre a escola particular e a pública.
Também não podemos achar que a construção e ampliação das escolas seja a panacéia de todos os problemas educacionais. Investir nesta área também é uma demanda histórica, pois temos escolas sem o mínimo de espaço para a prática de esporte, de conforto para os alunos, de laboratórios, biblioteca e ambiente de professores. Certamente construir e ampliar escolas devem estar na ordem do dia, mas é preciso que todas as escolas tenham o mesmo padrão, pois instituir uma política pública é universalizar um serviço, sem diferenciações, para toda a população, senão teremos aquelas longas filas para um determinado estabelecimento escolar e os não contemplados baterão em outra porta.
É preciso então valorizar o professor e os técnicos administrativos. É inadmissível termos professores com contratos precários, recebendo salário mínimo e sem nenhuma garantia de que estarão amanhã na rede de ensino. Este é o legado deixado por administrações passadas que usaram este expediente como moeda de troca em época de eleição. Compreendemos a impossibilidade de simplesmente dispensar estes trabalhadores, mas é preciso equipará-los aos professores efetivos com os mesmos ganhos trabalhistas. E mais, que seja realizada uma transição planejada, pois os professores efetivos recém concursados assumem suas tarefas nas escolas sem nenhum contato com os temporários, às vezes no meio do ano letivo. Defendo a idéia que tenhamos dois professores, temporariamente, numa mesma sala de aula - é isso que chamo de transição planejada.
A valorização financeira é outro pilar deste processo. Não podemos pensar num sistema municipal de ensino sem professores com dedicação exclusiva. Hoje a maioria dos professores trabalha em duas ou mais escolas, não vive a rotina dos seus alunos, não consegue estabelecer um vínculo com a instituição e recebe um salário aviltante. A carreira do magistério deve contemplar o professor com dedicação exclusiva, assim como faz a carreira do magistério superior, com gratificações que incentivem o trabalho em uma única escola em tempo integral, fortalecendo as relações didáticas com a comunidade onde a escola está inserida.
Os professores também devem ser contemplados com cursos de pós-graduação, em especial cursos de mestrado e doutorado. A Prefeitura Municipal deve priorizar este processo estimulando os professores a realizarem as seleções nos programas de pós-graduação, bem como criar os mestrados interinstitucionais (conhecidos como Minter) com a Universidade Federal. Além disso, a experiência da Formação Continuada de Professores através de Chamada Pública deve ser mantida e aprimorada. Os editais devem contemplar propostas interdisciplinares, com atuação de no mínimo dois anos. As atividades de formação continuada precisam estar mais articuladas com o cotidiano da escola pública, mais vinculadas com as demandas da realidade da escola e com uma maior participação dos professores na escolha dos tutores e das discussões pedagógicas. Em 2008, entraves burocráticos dificultaram a participação de instituições federais na Chamada Pública, valorizando pessoas físicas e empresas o que deve ser repensado para 2009, além disso, os recursos alocados para o custeio dos projetos sofreram atrasos no repasse dificultando algumas ações previstas.
No campo das discussões dos referenciais teóricos é preciso reformular as Diretrizes Curriculares elaboradas na gestão passada e que carregam contradições e concepções extemporâneas. É preciso pensar numa estrutura de construção das novas Diretrizes, com a participação de todos os setores envolvidos com o processo educacional. A experiência do Governo do Paraná, apesar das nossas diferenças sociais e econômicas, mostra que a Pedagogia Histórico-Crítica pode dar uma contribuição tremenda a este debate, pois é uma pedagogia vinculada à realidade da escola pública, construída a partir da análise das contradições e da crítica do sistema capitalista e deseja contribuir com a transformação de nossa sociedade. Dessa maneira é preciso evitar os “modismos” pedagógicos que invadem a escola pública através dos chamados pacotes educacionais. É preciso superar também as concepções reprodutivistas, as imposições do governo passado (leia-se PCN´s) e as teorias não-críticas.
Os professores da rede pública estadual do Paraná passaram anos debruçados sobre as bases teóricas da Pedagogia História-Crítica e hoje a rede possui Diretrizes Curriculares consistentes teoricamente em todas as áreas de conhecimento. A partir desses debates estes professores construíram o Livro Didático Público, ou seja, os alunos do Paraná estudam através dos livros elaborados por seus próprios professores, garantindo a relação direta da realidade local com as temáticas trabalhadas em sala de aula. Este é um exemplo a ser seguido, pois rompe com a lógica mercadológica dos livros didáticos empresariais e afirma a possibilidade dos professores construírem o conhecimento junto com seus alunos e suas realidades locais. Além do mais, os professores da rede pública estadual do Paraná receberam incentivos na carreira para construírem os capítulos do livro didático público (que estão à disposição de qualquer professor, na íntegra, bastando acessá-los na internet).
Exemplos como este, mostram que o trabalho coletivo, vinculado à valorização do magistério e a melhoria das condições de trabalho podem favorecer a melhoria da escola pública. Mas, este projeto educacional deve ser articulado com um projeto maior de sociedade. As transformações sociais é que vão ditar as transformações no campo educacional. Por isso, a idéia tosca de valorizar o professor através da “meritocracia” instituindo “prêmios” financeiros para quem se destaca só faz aumentar as diferenças e institui um apartheid educacional.

2.1.09

Gabriel e Florentino (O amor nos tempos do cólera)

Conheci Gabriel da melhor maneira possível. Comecei por um livro menos denso e mais direto. Como não ler um livro chamado “Memória de minhas putas tristes”, de uma capa singela e de bom gosto? Sempre quis compreender o universo do autor e que aquele livro fininho, de título sugestivo, cumpriu a função. Uma obra deliciosa, abocanhada por uma mordida só, feito aquele sanduíche apetitoso, digerido rapidamente depois de uma longa tarde de fome. Daí, não parei mais, passei para o fantástico “Ninguém escreve ao coronel” e fiquei preso no clássico “Cem anos de solidão”, que requer uma ruminação maior. Infelizmente, ainda não cheguei até o fim e coloquei outros sabores no meu cardápio. Traí o Gabriel e enveredei-me por “Ensaio sobre a cegueira”, desejando pagar minha dívida com o Saramago. No mesmo lastro, misturei feijão com camarão e sigo lendo, pela segunda vez, “Germinal” de Émile Zola, juntamente com “Histórias de Presidentes” – café, almoço e jantar ao mesmo tempo, mas este é preço da ociosidade das férias e a cabeça não pode parar como diria Rauzito.
De consciência pesada fui assistir “O amor nos tempos do cólera”, pois havia prometido que só adquiria esta obra após o término de “Cem anos...”. Mais uma vez fiquei encantado com o Gabriel. Se o filme conseguiu transmitir as intenções poéticas do autor é, de fato, uma obra magistral. Refletir sobre o que é o amor e o quanto ele pode durar é um trabalho sentimental fantástico, especialmente nestes tempos de amor supérfluo e descartável, exatamente como deseja o capitalismo para seus produtos.
51 anos, 9 meses e 4 dias foi o tempo esperado por Florentino, para poder ficar eternamente com sua amada. Em moeda de hoje quatro dias seriam suficientes para amar, transar, ter um filho e partir para outra. Filmes como este instiga uma reflexão profunda sobre os nossos valores, sobre as nossas relações diárias e sobre a subjetividade do ser humano. Não tenho dúvidas que a realidade concreta forja o ser humano, no sentido Marxista, e mais que nunca percebo que as relações comerciais capitalistas destroçam sentimentos e forjam o ser humano egoísta. Certamente Gabriel não discorreu diretamente sobre esse assunto, mas, as idiossincrasias de Florentino fizeram-me mais humano.