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14.5.15

Mimo

Sumimos neste quadro grotesco
De janelas cerradas
De grades e cercas
De gente enclausurada

Para tanto, só mimos

Sobrevivido

Tenho sobrevivido aos abalos vívidos
Dos tremores sísmicos
Da escala ríspida

Tenho sobrevivido sem bares nem ares
Aos apelos do iogurte de sabor fenomenal
Em potes de uma vida insossa

Tenho sobrevivido aos rumores enlatados
Dos amores infiltrados
Com prazos recursais indeferidos

Tenho sobrevivido ao tempo
Aos espasmos midiáticos, à crítica teatral
As peças pregadas pela vida

Tenho sobrevivido especialmente
A esses restos de homens
A esses pratos de ontem
A esse ofício sem rumo
A essa noite sem fim

5.5.15

Sobrevivência escolar

Não era um cavaleiro diletante
Era apenas meu aluno, um cavalo e uma carroça
cheia de papelão
O ganha pão de um menino transformado em homem

Era apenas um aluno, distorção idade-ano
estudava no quarto ano fundamental

Era apenas um aluno
quinze anos
Ensinando o fundamental da vida
[a sobrevivência]
Na falta da infância
das letras
da família
da comida

Seguia roto nos descaminhos da vida
Gritou por mim: - professor!
Lembrei do dia em que pediu para repetir o suco
Poucas goiabas naquela merenda esquálida
E teve como resposta uma negativa seca
Tão esvaziada quanto seu estômago

Era mais um aluno que ensaiava durante as aulas
Capoeira, mata-leão, golpes afins
Com o objetivo de combater o aparelho repressivo

Não me caberia repreendê-lo
tornei-me seu discípulo
nesse árdua batalha pela sobrevivência