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30.5.09

Sister, remember your name!

Não deixe de ouvir Miss Celie's Blues na voz de Renato Russo

Legião Urbana

"Teve um tempo que ouvir Legião Urbana me fazia mal... sabe por que? sabe por que? Eu digo por que: ela falou você tem medo, aí eu disse quem tem medo é você..."
CD/DVD Legião Urbana e Paralamas Juntos (1988)

um instante

olhou fixamente para aquela menina

sentiu a verdade transpirando
o cheiro de gente
contagiou o ambiente

aquilo não acontecia todo dia

a bondade pululava
rebentava o intransponível
o sorriso era a maré mansa desejada

o inopinado acontecia
nunca tinha visto aquele rosto antes
apenas uma expressão foi capaz de denunciar

que ali, na sua frente,

surgia, placidamente, um ser humano
tão raro de encontrar
tão difícil de acreditar

tão marcante de conhecer

apenas uma certeza cimentou aquele encontro
nunca mais teria o prazer de revê-la
mas a plenitude daquele momento

o convenceu que ainda é possível acreditar
na vida

um dia na "Caros Amigos" número 61

Em 2002 mandei uma carta para a Revista Caros Amigos concordando com o polêmico artigo "Esporte Mata". A carta foi publicada e o autor, José Róiz, citou-me na réplica e concedeu-me a cidadania baiana.
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Por que esporte mata
José Róiz
Dos caros leitores da revista Caros Amigos, um baiano de Jequié, Lauro Xavier Neto, professor de educação física, concordou plenamente comigo, mas André Luiz Gomes de Araçariguama, SP, supõe que esporte nunca mata. Ao ler as duas críticas lembrei-me de uma entrevista que concedi ao programa Sem Censura, onde defendi a mesma tese: esporte mata. Nesse mesmo dia foi entrevistado também o cantor Morais Moreira, tendo ele afirmado que não existe baiano burro. De fato, sempre morei aqui no Sudeste, mas já convivi com centenas de baianos e nunca notei deficiência em nenhum deles.
A afirmativa do outro caro leitor merece explicação. Até concordo com ele, que esporte nunca mata, mas somente quando se trata de longevo. Esta categoria de indivíduos costuma passar dos 85 anos, mesmo comendo “pedra moída” e tomando “sopa de tachinha” todos os dias. Creio que jamais escreveria o livro Esporte Mata se toda a humanidade fosse composta somente de longevos. Mas, como a maioria não é longeva, está sempre sujeita a vários tipos de doença. Mas como o esporte mata? O mecanismo de ação desse tipo de morte merece ser esclarecido.
Meu cunhado sofreu infarto aos 32 anos, jogando futebol de salão, mas não morreu porque deve ser meio longevo, isto é, sua expectativa de vida deve estar em torno de 75 anos de idade, porque seu pai faleceu com 76 anos e sua mãe com 74. A média de idade, nesse caso, é de 75. Mas a medicina não é como as ciências exatas. Às vezes os pais morreram muito jovens, mas alguns dos filhos se tornaram longevos. Isso ocorre com alguma freqüência. Só não sabemos como pode acontecer.
Outro amigo meu teve infarto fulminante aos 55 anos de idade, também jogando futebol de salão. Isso aconteceu porque sua genética deveria ser muito desfavorável.
No tempo em que o método de Cooper estava no auge, todo mundo corria todos os dias no calçadão de Copacabana e nas praças de quase todas as cidades. De vez em quando, um caía estatelado e era levado para o cemitério.
Esse tipo de morte se dá do seguinte modo: quando o indivíduo não é longevo, isto é, quando em seu organismo predomina o hormônio da supra-renal denominado glicocorticóide, cuja atividade é impedir a ação da insulina, que procura “limpar” o sangue, enviando para os tecidos o excesso de muitas substâncias, como a glicose, o ácido úrico, o colesterol, o LDL (colesterol “ruim”) etc., todas essas substâncias tendem a aumentar no sangue. O aumento de LDL determina o aparecimento de placas de ateroma nas artérias e o espessamento delas, diminuindo o calibre desses vasos e, conseqüentemente, a nutrição do próprio coração, que finalmente se obstrui e constitui o infarto.
Havendo na maioria das pessoas a predominância do glicocorticóide, é natural a freqüência do aparecimento do infarto. A prática de exercícios aeróbicos, como a corrida, a natação etc., irá antecipar muito esse desfecho, daí a razão de ser permitido dizer que esporte mata. A antecipação da morte está ligada ao esporte estressante. Ora, se ele é dessa natureza, aumenta a produção dos dois hormônios do estresse: a adrenalina e o glicocorticóide. Portanto, se há aumento de produção de glicocorticóide, é de se esperar que aumente também o LDL no sangue e, conseqüentemente, haja maior espessamento das placas de ateroma.
Há muitos anos pedi a alguns jovens do Minas Tênis Clube que dessem alguns “tiros” na piscina para eu medir a pressão arterial deles antes e depois desse pequeno exercício. Notei que a pressão de alguns estava em 9/12, isto é, era uma pressão convergente, indicando que a capacidade do coração deles era aquém do normal. Esses jovens, praticando esporte, estariam sujeitos a ter o que se chama de colapso, isto é, predispostos a ter uma parada cardíaca e morrer repentinamente. Aqui não entra aumento de LDL no sangue, formação de placa de ateroma e infarto. O mecanismo é diferente, mas esporte mata.
Esporte só não mata longevo, mas esse tipo de indivíduo pode ter infarto. Isso pode acontecer quando ele abusa da alimentação e fica com excesso de LDL no sangue. Sua insulina é mais eficiente, mas ele comeu demais e nem todo o excesso será enviado para os tecidos, ficando um pouco no sangue, para determinar formação de placa de ateroma, e um dia ele pode ser acometido de infarto, que geralmente não o mata.
Esporte só não mata longevo, mas a maioria das pessoas está sujeita a ser faturada por ele, principalmente nessa época de muita agitação em que vivemos. Atualmente há mais estresse do que há cinqüenta anos, isto é, a produção de glicocorticóide está muito aumentada na maioria das pessoas. Muito cuidado, esporte mata!
Indivíduo muito musculoso geralmente tem mais força física. Mas não vá pensar que ele é também mais sadio e possa viver mais do que você. Isso não acontecerá nunca. Pelo contrário, ele tem menos saúde e viverá menos do que o indivíduo normal. A razão disso está na sobrecarga do coração do atleta para alimentar também todo o excesso de tecido que foi criado. Ele foi feito para ter músculos de dimensões normais. A natureza jamais os faria hipertrofiados. Não faria porque, se os fizesse assim, estaria contrariando a si mesma, isto é, a perpetuação da espécie, pelo que ela sempre lutou.
A aptidão atlética encurta a vida porque ela se liga ao excesso e todo excesso é causa de envelhecimento. Essa afirmação é outra maneira de dizer que esporte mata.
Fonte: Caros Amigos nº 61 (abril de 2002)

Evento

mais um evento
brisa, rajada, ventania
cantilena - nos faz dormir

mais um evento
aragem, chuva forte, corre-corre
palavras soltas - nos faz criticar

mais um evento
queixume, conjuntura, stalin-trotsky
desavenças incessantes - nos faz chorar

mais um é vento
sem propósito
sem fronteiras
logo cedo acordei
e seguirei para mais um
evento

29.5.09

A banca

não confio em bancas

em bancos

não confio em tantos números



bancarrotas de desejos

bancas marcadas

para morrer



bancas que definem vidas

atormentam os sonhos

destituem os desejos



bancas injustas

meritocráticas

individualistas

terminalistas



bancas de relatórios

assinaturas mil

arrazoados infinitos

bancas que nos arrasam



bancas mudas

sem poemas

sem rimas

bancas rudes



detesto bancas

bancos

filas

notas

reprovações



detesto bancas

que desfiam o saber

tecem horrores

e aprovam o vazio

Procuro amigos

Procuro amigos
nas gavetas do escritório
nas sarjetas da cidade sanatório
nos escaninhos da vida alheia

Procuro amigas
que vivem com pouco dinheiro
apreciem um bom livro
rejeitem o cinema que aí está

Procuro amigos
de Carne Trêmula
do Manifesto
Do panfleto
do suco de laranja
sem açúcar

Procuro amigas
que apreciem cerva preta
não tenham preconceitos
nem religião

Procuro amigos
que me critiquem
adorem café gelado
e ainda acreditem na transformação

Procuro amigas
que falem com o coração
gritem palavras uníssonas
escrevam cartas de amor

Procuro amigos
que não se vendem
não contem dinheiro
e não assistem novelas

Procuro amigas
de longa data
que gostem de histórias velhas
e de novos sonhos

24.5.09

Capitão Feio e seus amigos!




meu curioso amigo



PARA SANDOVAL BUTTON
A primeira impressão, um sorriso marcante
Uma voz sincera, um tom compassado
A sinceridade brota dos teus ossos
Contagia os ares e se expande mundo afora

Ah, Camarada, de tantas histórias
Do Movimento sem fim

Teu ar enche meus pulmões
Vocifera, brada, equilibrado
Não aumenta o tom,
... mantém o respeito

Teus olhos chorões,
Tua alegria
Teu broto germinando
Em dose dupla
Reverbera mundo afora

Ah, Camarada, tu és curioso
Tua leveza traz juventude
Tua clareza, mansidão
Revigora mundo afora

Sê mais que tu és
Ombro amigo
Beijo sincero
Ser humano que quebra a lógica
Egoísta deste mundo,
Que nos separa

Tua cadência alumia
Mundo afora
Ilumina o futuro
Grãos de areia,
Próximos a brotar

Ah, Camarada,
Que a tua próxima geração
Seja a bandeira desfraldada
Do novo mundo
Mundo afora...

3.5.09

O choro e a razão cínica

Encontrei esse texto meu, escrito em 2003, na página "Chico Terra - imagens e notícias da Amazônia" e resolvi republicá-lo no blog.

Escrito por Lauro Xavier Neto
01-Dec-2003
Dois episódios marcaram esta semana a história política do Brasil. O primeiro foi o prelúdio de uma coragem que não vingou, o segundo representou a coragem de um choro soluçoso. A imprensa escrita registrou o primeiro, a TV Senado o segundo – eternizaram na memória dos brasileiros."O Triunfo da Razão Cínica" – artigo de César Benjamim na Caros Amigos número 80 – parecia o anúncio da coragem da esquerda brasileira em romper com os esquemas perniciosos do Governo brasileiro, junto à estrutura imperialista na qual continuamos dependentes.
Parecia um ato organizado de subversão à ordem vigente, um grito ressoante que faria chegar aos ouvidos de milhares de militantes do movimento social como um sinal beligerante do coordenador da Consulta Popular. "Veja bem nosso caso é uma porta entreaberta", já alertava Gonzaguinha que parecia caminhar de mãos dadas com um Benjamim denunciador, consciente e exasperado com a situação de degradação que se encontra o Partido dos Trabalhadores. Na denúncia, o autor de olhos bem abertos, mostra representação da Articulação, que diz não ter o poder, mas tem o Governo (de coalizão), que num continuísmo descabido despreza o sonho de milhões de brasileiros, ignora aqueles que construíram o partido e cede favores e a legenda a todos os mentecaptas, corruptos e assassinos do passado, hoje aliados e responsáveis pela governabilidade.Benjamim aponta a onda de desemprego, porém esqueceu (ou não houve mais laudas) de denunciar de forma contundente as reformas burguesas que o Governo vem impondo aos trabalhadores, os cafés da manhã com Bush Jr. no intuito de apressar os acordos da ALCA, a liberação dos transgênicos, a demora no Plano de Reforma Agrária, o criminoso superávit primário que retira dos cofres públicos dinheiro que deveria estar a disposição do país, e ao contrário serve ao FMI.
O país continua o birô dos interesses do imperialismo norte-americano que mata milhares de pessoas com a sua ganância capitalista.O PT só quer o poder, anuncia e denúncia o escritor. Nessas mesmas linhas o jornalista paraibano Oduvaldo Batista já anunciara num dos jornais da capital mais verde do Brasil: "O PT foi criado pela ditadura militar, articulado pelo Golbery". Difícil acreditar nesse pensamento? Uma pátria semiadormecida, desarticulada politicamente, uma Central de Trabalhadores calada ante o desmonte de garantias previdenciárias, um estrondoso número de militantes catatônicos, afônicos ou cantando em prosa e verso um discurso neoliberal, "alguma coisa está fora da ordem?".
O Benjamim não pede para o Lula fazer uma revolução, mas pede desculpas no outro dia pelo que escreveu. Acreditem! Os leitores cadastrados no sítio da Caros Amigos receberam uma mensagem eletrônica do autor se dizendo raivoso e maniqueísta. "Recuem nobres cavaleiros, não é chegada a hora de avançar". Pasmem! Tática, estratégia, ou covardia contagiante? Não, Benjamim, não me senti agredido com seu texto, ao contrário, senti um regozijo (efêmero) acreditando ser a hora de juntarmos esforços e esperanças, num sentido concreto, e não cínico, em busca da tomada de poder pelo povo brasileiro.Ao fechar a revista, ao ler a mensagem de desculpas, sigo para a TV. A reforma da previdência está para ser sacramentada pelo Senado. Já havia passado pelos "trezentos picaretas" e só necessitava de 3/5 de 81. Quantos/as senadores/as representam a vontade do povo? Repito a pergunta: quantos mil reais se faz um senador/a? Quanto vale a ideologia e a consciência de um/a parlamentar? Quantas noites de sono custou ao Mercadante (um homem inteligente já dizia minha mãe) a permanência de Toinho Malvadeza no senado?
Só encontrei uma pessoa de coragem, chorosa, mas corajosa naquele parlamento. Assisti com emoção ao discurso de Heloísa Helena na TV senado, que mostrou a todos os covardes, outrora militantes do povo, a história do PT contada não por intelectuais, mas por aquela que ajudou a construir um partido às custas de por em risco sua própria vida, lutando contra coronéis e reacionários que junto ao poder não queriam largar o osso, caminho político apontado por Benjamim em seu texto. Não bastante tudo que se passava naquela sessão, vem o Mercadante e cita o Max Weber, assume que não tem coragem de colocar em risco o poder tão sonhado, que não pode fazer nada pelo povo tão sofrido e que o dragão da maldade, travestido de imperialismo, venceu a história daqueles que construíram um partido dito popular. Responsabilidade e convicção não se misturam, segundo o economista, e o pragmatismo do Governo não consegue observar a fome e a brutalidade para com o povo brasileiro, não enxerga um palmo a frente a ideologia que aparentemente sempre construíram. Fico com o prelúdio do Benjamim, com a lágrimas da Helena e repudio o cinismo do homem inteligente.
O PT e sua sede de poder acabam por ressuscitar figurinhas carimbadas da história reacionária do país. Acende a chama do Mão Santa (PMDB/PI), faz surgir o Efraim Moraes (PFL/PB) e tantos outros direitistas que fazem jogo de cena para fantasiar com a mente da população brasileira – o grande circo está armado. Por outro lado, e a dialética permite isso, a firmeza da senadora chorosa não se apagará da mente daqueles que acreditam na transformação social, não aquela transformação por demais demostrada que corrompe as almas, os bolsos e os egocêntricos, a transformação propriamente dita, aparentemente conclamada na coluna de Caros Amigos e realmente esbravejada da tribuna do senado.
Enfim, entre o choro e a razão cínica germina no país um sentimento de frustração, bem demostrado pela Heloísa Helena, uma amargura sem precedentes daqueles que ajudaram a construir um sonho e acabaram por propiciar um ato desavergonhado de entrega do Brasil ao capital estrangeiro e aos interesses das corporações. Cabe agora enxugar as lágrimas e iniciar o comando de uma ação nunca expressa em revistas ou transmitida via satélite pela TV. Uma ação coordenada sem choro, nem cinismo, porém eficaz em suas conquistas de liberdade, soberania e luta popular._______________________________________________________
Lauro Xavier Neto é professor de Educação Física na UESB, mestrando em Educação Popular na UFPB.