Lamentável, porém previsível, tudo o que está acontecendo no "julgamento" do projeto de iniciativa popular da Ficha Limpa. Previsível, pois Marx já havia dito que "as ideias dominantes, são as ideias da classe dominante". Não há surpresa no fato do STF tencionar a "constitucionalidade" do projeto (escrevo já sabendo do empate de cinco a cinco). Lamentável, pois acreditamos que estaríamos perto de uma moralidade nesta política eleitoral suja e mesquinha que de fato é um arremedo (não é seu ministro?!?) de uma pseudodemocracia.
Entrei com recurso contra um candidato a deputado estadual pelo PSL, ex-prefeito de Cuité/PB, no TRE e apresentei contrarrazões no TSE. Fiz como cidadão, como servidor público federal, fiz pela moralidade, fiz sabendo que estou sendo diuturnamente observado no município e todo dia chegam as frases de intimidação. "Você é muito corajoso", "Você não sabe com quem está mexendo", "Cuidado que há conversas na cidade de pessoas querendo saber quem é o professor da universidade que impugnou o candidato da região", “Cuidado para não acordar com a boca cheia de formigas”.
Moro em Cuité há dois anos, tenho acompanhado a vida política da cidade e tenho trabalhado com meus alunos com a disciplina de Legislação da Educação Básica (além de outras) e temos feito um apanhado dos recursos vinculados à educação em toda região. Estamos colhendo dados do Portal da Transparência, do FUNDEB, do SAGRES (TCE/PB) e estamos dialogando diretamente com os professores das escolas públicas. Constatamos que os prefeitos ainda atuam como coronéis, como desestabilizadores dos Conselhos de Controle Social. O medo, a coação, o descaso com a coisa pública dão a tônica de uma administração perversa que domina gerando ódio e apartação.
Verifiquei que o atual candidato a deputado estadual pelo PSL foi prefeito de Cuité (sua esposa é a atual prefeita) e teve suas contas rejeitadas pelo TCE/PB em 2002 e 2004, isto me fez entrar com o pedido de impugnação de sua candidatura. Descobri que outros processos existem contra o ex-gestor, um deles no TCU outro no TRF 5º região.
No TRE/PB o pretenso candidato perdeu por 3 a 2 e recorreu ao TSE. Em decisão monocrática o ministro Versiani aponta que:
“Destaco, também, trecho do acórdão do TRF da 5ª Região, acerca dos fatos apurados na ação civil pública (fls. 119-120):
No caso concreto, a fiscalização acima concluiu que o apelante, na condição de prefeito, descumpriu o art. 7º da Lei 9.424/96, porquanto somente aplicou na remuneração e valorização do magistério o percentual de 38,20%, ao invés dos 60% reclamados legalmente.
Por sua vez, o apelante seja através de alegações, ou mediante outras provas, não demonstrou o contrário.
Por sua vez, o apelante seja através de alegações, ou mediante outras provas, não demonstrou o contrário.
De notar também que tal foi realizado conscientemente, o que caracteriza o dolo, uma vez que o apelante, na condição de prefeito, estava em plenas condições de saber que não se encaixavam na remuneração e valorização do magistério dispêndios com gratificação a músicos de banda filarmônica, transporte de equipe de futebol, material esportivo, produção de filmes publicitários, refeições para atletas, dentre outras.”
E o ministro arremata:
“Vê-se, portanto, que o ato doloso de improbidade administrativa reconhecido em decisão colegiada do TRF da 5ª Região evidencia dano ao erário e enriquecimento ilícito.”
O mais dramático é que as contas rejeitadas pelo TCE/PB foram aprovados pela Câmara Municipal, na época inclusive que o pai do ex-prefeito era presidente da Câmara e também teve suas contas rejeitadas pelo TCE/PB, e o ministro acolheu esse recurso, dizendo que o órgão responsável pela aprovação das contas é a Câmara e não o TCE!
Todo esse trabalho pode ser jogado fora e várias de pessoas que lutam pela moralidade na política (e na construção de uma nova cultura política como afirma a CGU) serão desmoralizadas com a decisão do STF. Este escárnio promovido pelo Supremo mostra que o processo eleitoral nesta sociedade capitalista está vinculado aos interesses dos poderosos que enriquecem ilicitamente utilizando dinheiro e a máquina pública.
Mas temos que ver o lado positivo da coisa. Esse desdém da “justiça” com a moralidade política gera revolta do povo que não aguenta mais ser vilipendiado por esses políticos carreiristas. Este é o momento da organização popular, do protesto, do voto nulo, da ocupação dos espaços pela organização popular. Este é um momento ímpar de concentrarmos esforços para pensarmos numa outra forma de organização do Estado. O sistema capitalista carrega o germe da corrupção, do judiciário vende-pátria, da exploração, do ódio e da possibilidade revolta popular. Assim surgiram as FARC´s, o Sendero Luminoso, os Zapatistas e tantos outros criticados pela burguesia (e seus sistemas de comunicação) e tantas vezes descaracterizados deliberadamente, no intuito de escamotear de onde surge verdadeiramente a violência que assola nosso país, pois como diria Bertold Brecht, em seu poema “Sobre a violência”:
“A corrente impetuosa é chamada de violenta
Mas o leito de rio que a contém
Ninguém chama de violento.
A tempestade que faz dobrar as bétulas
É tida como violenta
E a tempestade que faz dobrar
Os dorsos dos operários na rua?”
Senhores ministros que votaram contra a Ficha Limpa, termino com a cantata popular dos Movimentos Sociais: “o risco que corre o pau, corre o machado, não há o que temer!”.
PS: infelizmente candidatos a deputado estadual como Nadja Palitot e Francisco Barreto estão no mesmo partido deste candidato que, segundo o ministro Versiani, enriqueceu ilicitamente e causou danos ao erário público. Portanto, acabam fazendo parte desta disputa viciada do processo eleitoral. Tanto Nadja, quanto Barreto, tem uma vida ilibada mas podem eleger um Ficha Suja pelo coeficiente eleitoral.
Um comentário:
"O mundo só poderá ser salvo, caso o possa ser, pelos insubmissos."
(André Gide)
Postar um comentário