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24.6.09

Fome

Esta dor no meu peito não é a falta de açúcar ou de sal
É meu sentimento altruísta que aflora
Ao enxergar a fome de um bilhão

Esta dor que me acompanha
É fruto do meu egoísmo
Que deseja assistir a mudança radical
Deste vasto mundo

Enfraqueço, esmoreço, desabo
Fico contando nos dedos
À espera do retorno instável
Da felicidade de bilhões de seres humanos

22.6.09

Germinal (para Emile Zola)

Peço aos caros amigos que não mantenham esta postura pusilânime
Que não acobertem sonhos alheios
É preciso persistência
Cabeça erguida

É preciso olhar o céu de peito aberto

As agruras serão enormes
Traidores serão aos montes
Incontáveis

Cabeças de amendoim não faltarão
Estarão presentes em cada esquina
Mas o sol irá aquecer nossa ira

Amizades artificiais brotarão dos convéns
Dançarão xote, xaxado e baião
Mas não serão tão pungentes
Quanto nosso grito secular

Pequenos brotos germinarão
Neste chão árido
Nesta terra inóspita
Frutos do nosso desejo incontido

Caros amigos não se acovardem
Não permitam esse broto morrer
Sem florir

Não assistiremos o derradeiro suspiro
Dos covardes escondidos
Mas deixaremos as raízes
Para as gerações futuras
Brindarem a nossa memória

Caros amigos...

19.6.09

Pour Anne Frank

Maria, Margarida, duplo ene
que força tem o prenome
que expande horizontes
conta histórias sem parar

minha vida construída por um nome
uma mãe, uma flor, uma irmã

desejo latente de jogar bola
brincar de carrinho
ou simplesmente bater um papo

minha vida foi subindo escadas
amordaçando conflitos
apaziguando acordos beligerantes
mordendo os lábios
e sendo mordido pelo tempo

que reencontro fantástico
e um nome com dose tripla
caráter fortíssimo
alegria contagiante
mundos parecidos e distantes

posso passar horas te escutando
nem preciso abrir a boca
meus olhos falam mais
mesmo que você nem entenda

pinto, bordo, desenho
passo o tempo com amenidades
enxugo lágrimas e devaneios
enquanto aguardo outras conversas
no sopé da minha infância

17.6.09

quantos reis mal coroados ainda teremos que enfrentar?

(Vandré) Recebe a visita de Geraldo Azevedo e os dois finalizam a música, "Canção da despedida", que cita "um rei mal coroado que não queria o amor em seu reinado pois, sabia, não ia ser amado" em alusão ao "rei Arthur", o marechal da Costa e Silva. No refrão, vêm a constatação e a promessa:



- Já vou embora, mas sei que vou voltar / Amor não chora / Se eu volto é prá ficar...



O cantor ultrapassa a fronteira e chega ao Uruguai.


Brasília não assiste ao show de Geraldo Vandré. Em dezembro de 1968, o silêncio vence a música.




MARCELO, Carlos. Renato Russo - o filho da revolução. Rio de Janeiro: Agir, 2009.




Muito mais que uma biografia...

15.6.09

onde mesmo?

Onde me encontro?
No som dos Aviões
Na balada noturna
Contando dinheiro
(não, não, não)

Onde me encontro?
Vestindo black-tie
Assobiando heresias
Comprando carne vermelha
(não, não, não)

Onde me encontro?
Em Wall Street
Na Disneylândia
Ou em Paris
(não, não, não)

Estou nos becos, nas palafitas
No campo e na cidade
Ando me procurando

No cadarço do teu sapato
Nos botões do teu pijama
No porta-luvas do teu carro

Ando com chinelo no pé
Para poder anunciar que estou chegando

sobre o mar

O mar não carece de sol
Basta por si mesmo
Nas profundezas esconde meus desejos

Mergulho mar a dentro

Me esquivo dos náufragos

No mar me embriago
Tomo doses homeopáticas
De sal grosso

Espanto fantasmas
Avisto arraias
Delicio-me com as baleias

No mar procuro golfinhos
Encanto sereias
Canto para dormir

A sinfonia marítima
É o despertar da manhã

Sono, sonho, desejo

O mar basta por si só

12.6.09

1001 - SETUSA


mil e um era a minha liberdade
cruzava casa, escola, amigos
rodopiava lotado
inerte

mil e um era a lei de Newton
gente espremida enlatada
às seis da manhã
nenhum corpo podia se mover
naquele mil e um
com cinquenta pessoas

aluno fardado, passagem gratuita
mil e um - mandacaru-jardim-planalto
vi gente escondida, amorfa
saltando pela porta de trás

por diversas noites dormi
na sua lataria
esperando o ponto final

vi bairros inteiros
diferenças enormes
barracos e mansões

no mil e um
vi o projeto neoliberal
sucatear deliberadamente
as ações do Estado

derrotaram o mil e um
público, gratuito e de qualidade

hoje mil e um são os visitantes
deste blogue

Imagem obtida em: http://www.geocities.com/setusa/

"Cícero primeiro sucateou a empresa e depois vendeu-a a preço de banana em fim de feira".
"Abandono - hoje se encontra vários Setusas em um ferro velho na Av. Cruz das Armas (perto do viaduto do oitizeiro). Uma peça que deveria estar em um museu hoje encontra-se em estado de putefração..." http://www.geocities.com/setusa/

8.6.09

Não é xenofobia

Não entro em sites
Visito sítios

Não faço postagens em blogs
Escrevo blogues

Não uso e-mail
Digito i-meio

Não clico em mouse
Uso o rato

Não bebo coca-cola
Só tomo suco natural
sem açucar

Não é xenofobia
é libertação

Não deixe de assistir: "Home - Nosso Planeta, Nossa Casa"

Adoro (para o amigo Manoel Gomes)

Adoro descobrir palavras novas

Adoro teu jeito inefável de escrever



Adoro ter orgasmos literários

quando descubro as palavras

em Clarice



Adoro dicionários

Adoro percorrer os labirintos

escuros dos contextos



Ler quadrinhos

Ler desejos

Reler "O primeiro beijo"



Detesto ler na primeira página

que a "Paraíba é segundo no Nordeste

em número de eleitor

analfabeto"

passados 20 anos... (broche de 1989)



Quase acreditei na sua promessa
E o que vejo é fome e destruição
Perdi a minha sela e a minha espada
Perdi o meu castelo e minha princesa.
Quase acreditei, quase acreditei
E, por honra, se existir verdade
Existem os tolos e existe o ladrão
E há quem se alimente do que é roubo
Mas vou guardar o meu tesouro
Caso você esteja mentindo.
(Metal Contra as Nuvens - Legião Urbana
Composição: Dado Villa-Lobos/ Renato Russo/ Marcelo Bonfá)