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30.3.12

Vejo a unção dos enfermos da freira encapuzada
Junto ao mancebo
Enquanto um chapéu de couro atravessa a rua
Calçando alpercatas

Crianças no meio da rua, com suas fardas de escola pública
Parabólicas em frágeis telhados
Debruçadas em casa de pau a pique
Ou construídas por João de Barro

Silêncio total às seis da tarde
Pois a rádio poste recita Luiz Gonzaga
Chorando a Ave Maria

Não há cinema
Não há teatro
Não há Bolero de Ravel
Apenas o pôr-do-sol agonizante
Que queima a caatinga

Mas há pneus travestidos de traves
Que fazem a festa dos boleiros

Goleiros não há, apenas uma bola murcha
Chutada com o prazer de um gol em pleno Maracanã

Na manhã seguinte, segue o cortejo
Pois a unção dos enfermos
Era só para aliviar a alma dos que seguem
Sorrateiros atrás do seu destino

Sigo,
Cego,
Semi
nu,

[Quase não vejo felicidade]

Nesse deserto idiossincrático do resplandecer nordestino...

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