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4.10.25

Incidente em Alhures

Para Érico Veríssimo


Meu coração está inçado de velhacarias

Apaixonado por LP's arranhados e imaturos


Saudoso do Carinhoso cantado por Betânia 

Tocado por uma vitrola num setembro obscuro


Coração achincalhado pelo tempo

Entupido por amores gordurosos 

Assoberbado por foras eloquentes 


Não mais bombeia sangue

Jorra gritos e gemidos

Range sons e mastiga com velhos dentes 


Entre encruzilhadas, artérias e ruas vazias

O mar vermelho viscoso é apenas um incidente


Meu coração, na verdade, deseja coonestar todas as atrocidades amorosas cometidas ao longo da vida

19.7.25

Escatologia

Este cérebro me domina

Faz galanteios e depois me abomina


Controla meus pensamentos 

Me faz surtar e depois reprime todos os acontecimentos 


Este cérebro é o morcego de Augusto

Surge, do nada, todo instante, não me deixa dormir o sono justo


Este cérebro sou eu, vil

Imaculado desejo, introspectivo e pueril


Este cérebro quer me dizer o que fazer, limpar a casa, assear o chão 

Dormir cedo, comprar o pão 


Este cérebro nada mais é que o desejo de ser eterno, enquanto dure

Ser imoral, vaidoso, prepotente e que todo tempo jure


Mas ele sabe que é temporal

Pois ateu sem porta sabe que vai ter um destino imoral

27.6.25

Travessuras de uma menina má

Ela já havia avisado que era uma menina má
ao estilo Vargas Llosa
e eu ainda estava em “Se enamora”

Foi a primeira vez que me apaixonei

avisado de cara do terreno pantanoso que havia me metido

mesmo assim continuei acreditando na doçura da amora


Foram eternos “Ainda é Cedo”

meninas me ensinando quase tudo o que eu sei

levando surras de noites e mais noites de verão


Lutei contra a crosta irascível que se formava

escutava músicas de amor até perder o medo

tateava a menina má em esquinas inabitáveis


Virei um reprovado contumaz

vendendo flores mortas

e ensinando meu filho lições incabíveis

9.1.25

Manifesto Parahyba

Sou o único Paraibano nascido em Recife

Tenho sangue mestiço, mameluco do leão do norte

Mergulho em corais e arrecifes


Sou o único Paraibano nascido em Recife

Por isso, não acredito que o mundo surgiu no Marco Zero

Sou mais os bondes do Ponto de Cem Réis


Mordo tubarão a grito na praia de Boa Viagem

Mas prefiro um banho tranquilo em Coqueirinho


Sou Ariano às avessas, pernambucano desnaturado

Não nasci no Palácio e tomei rumo

Li o Auto, mas agora releio Torto Arado


Não ostento o Galo, passo carnavais com as Muriçocas

Não faço rinha com quem é o maior do mundo

Gosto mesmo é de carne seca com paçoca


Não chio para mostrar o amor pelo (e)sport(e), nem tenho time fora de série

Não vou aos estádios aos domingos

Nem escondo minhas intempéries 


Sou o único Paraibano nascido em Recife

Filho de Das Neves e Frederico, na luta por seu nome sedimentado

Sem essa dos Cavalcanti, quero mesmo minha Parahyba grafada com ypsilone

6.12.24

Canção

 🎼


Eu prefiro ficar com esta canção para sempre


Cravejada no meu corpo

como uma marca indelével 


Como uma memória afetiva leve


Ela me faz atravessar paredes

chorar sem lágrimas


Voar mundo afora com minha azul rede


Mesmo que minha mesa esteja vazia, haverá sempre pão


Mesmo que  seque meu coração

nos dias de sol intenso, haverá sementes


Mesmo na solidão da partida

haverá uma plateia cheia de gente


que um dia regamos em nosso jardim  😍

20.5.24

Vulnerabilidade

Somente quando fiz dezoito anos

É que entendi que o tempo é relativo

Depende da vulnerabilidade de cada um


Na casa da então namorada

o mês era medido pelo queijo coalho

Bem pesado, um quilo, um pouco mais

e a luta para durar o mês


Triste quando era de trinta e um dias

o sufoco era maior


Felicidade plena apenas uma vez por ano

mais um motivo para reverenciar o carnaval


Demorei muito para compreender a pobreza e seus desenganos

Assim como aquela família demorava para deglutir aquele queijo sem sal

17.3.24

Ogivas

A ogiva do senhor da guerra não parece uma vagina
Parece um pau ereto

Não tem clitóris, apenas glande

Não é simpático com a vida
Deseja a morte de todos

Símbolo fálico da vitória pírrica
A paz dos túmulos desejada

Putin, Biden e ogivas, não rimam com vaginas

Vinícius nos perdoe

Rosas não rimam com ogivas

O cravo de Hiroshima deveria ser a licença poética