Páginas

27.3.19

Piso Salarial do Magistério


Vi na página da Câmara Federal, no dia 26 de março, a realização da sessão alusiva ao Dia Nacional do Piso Salarial dos Professores. Tomado como um grande avanço para o magistério, os professores não têm muito a comemorar. Primeiro, porque a Lei do Piso do Magistério estabelece como referência inicial o salário dos professores que têm a Formação Normal (Magistério de nível médio) e não estipulou uma porcentagem de aumento salarial para graduados, especialistas, mestres e doutores. Tal valor da progressão ficou ao sabor das leis municipais que quase sempre não são favoráveis ao magistério. Segundo, a Lei do Piso acabou virando a Lei do Subsolo, pois estabeleceu uma carga horária de referência de 40 horas de trabalho e os gestores municipais e estaduais acabam por fazer uma regra de três para carga horárias abaixo de 40 horas, rebaixando ainda mais o valor do Piso.

Tomo dois casos recentes, de duas prefeituras do Estado da Paraíba que realizam concurso em 2019, para mostrar essa dura realidade. A prefeitura de Lucena oferece um salário bruto de R$ 1.835,37 (26 horas) e a Prefeitura do Conde, com a oferta de salário de R$ 1.607,96 (25 horas). O piso salarial do magistério foi reajustado para R$ 2.557,74, em 1º de janeiro de 2019, portanto o valor pago pelas prefeituras é bem inferior a este valor. O salário dos professores da Educação Infantil da Prefeitura de Lucena é ainda mais perverso: R$ 1.595,98.

Com esta realidade, não há o que comemorar!

https://www2.camara.leg.br/camaranoticias/noticias/EDUCACAO-E-CULTURA/574092-CAMARA-COMEMORA-DIA-NACIONAL-DO-PISO-SALARIAL-DOS-PROFESSORES.html

13.3.19

A última sopa


Lambia copiosamente a panela transbordando com a sopa de ervilha. Mais uma vez, havia prestado atenção na receita antes do pior ter acontecido. Viu as batatas e cebolas cortadas sob a pia, observou a marca do óleo de oliva e as pitadas de sal. Sempre achou exagerado o tempo de cozimento e sempre resmungava que as proteínas poderiam se exaurir àquela temperatura. Mas, aquele caldo era único, um sabor que nunca encontrou nem mesmo nos melhores restaurantes. Por muitas vezes, tentou repetir a façanha e o máximo que se aproximava era com o verde daquele prato. Continuava a lamber cada gota da panela, pois sabia que era a última vez que sentiria aquele sabor, tomando cuidado para não pisar no corpo inerme que repousava no chão da cozinha. Num esforço hercúleo, tentava evitar que as lágrimas caíssem sobre a sopa e estragassem aquele sabor fenomenal. Por fim, esfregou os dedos na panela, descolou restos apurados que estavam pregados, e finalmente limpou todo o fundo e as laterais até encontrar o reflexo do seu próprio rosto. Nunca mais suas papilas sentiriam aquele sabor. Terminada a procissão gustativa, teria que iniciar o ritual de despedida. Ela se foi, inesperadamente, logo após passar a sopa no liquidificador e retorná-la à panela. Apenas um suspiro marcou a distância entre a dor e a morte – foi tudo muito rápido.

8.3.19

Necrotério

nunca mais visitei o túmulo dos poemas-mortos
nunca mais joguei cinzas ao vento
nunca mais uma banda de rock musicou meus escritos decadentes

nessa terra de gigantes
nunca mais a juventude foi uma propaganda de refrigerantes
nessa terra de gigantes
olho por olho dente por dente

nunca mais orei por meus poemas-mortos
e aqui jaz um poema delirante

Poemorto

Lamento informar que, na madrugada deste domingo, faleceu Poema S.A. de Falência Múltipla das Rimas em decorrência da Síndrome da Imunodeficiência de Versos Não-Adquiridos. O velório acontece na Academia dos Poemas Mortos.